Não Somos Capazes de Distinguir o que é Bom e o que é Mau
Quantas vezes um pretenso desastre não foi a causa inicial de uma grande felicidade! Quantas vezes, também, uma conjuntura saudada com entusiasmo não constituiu apenas um passo em direcção ao abismo — elevando um pouco mais ainda alguém em posição eminente, como se em tal posição pudesse estar certo de cair dela sem risco! A própria queda, aliás, não tem em si mesma nada de mal se tomares em consideração o limite para lá do qual a natureza não pode precipitar ninguém. Está bem perto de nós o termo de tudo quanto há, está bem perto, garanto-te, o limite desta existência donde o venturoso se julga expulso e o desgraçado liberto; nós é que, ou por esperanças ou por receios desmesurados, a fazemos mais extensa do que realmente é. Se agires com sabedoria, medirás tudo em função da condição humana, e assim limitarás o espaço tanto das alegrias como dos receios. Vale bem a pena privarmo-nos de duradouras alegrias a troco de não sentirmos duradouros receios!
Por que motivo procuro eu restringir este mal que é o medo? É que não há razão válida para temeres o que quer que seja; nós, isso sim, deixamo-nos abalar e atormentar apenas por vãs aparências.
Textos sobre Existência
255 resultadosVida Ilusória
Ao mesmo tempo que a realidade é uma fábula, simulações e enganos são considerados como as verdades mais sólidas. Se os homens se detivessem a observar apenas as realidades, e não se permitissem ser enganados, a vida, comparada com as coisas que conhecemos, seria como um conto de fadas ou as histórias das Mil e Uma Noites.
Se respeitássemos apenas o que é inevitável e tem direito a ser, a música e a poesia ressoariam pelas ruas fora. Quando somos calmos e sábios, percebemos que só as coisas grandes e dignas têm existência permanente e absoluta, que os pequenos medos e os pequenos prazeres não passam de sombra da realidade, o que é sempre estimulante e sublime. Por fecharem os olhos e dormirem, por consentirem ser enganados pelas aparências, os homens em toda a parte estabelecem e confinam as suas vidas diárias de rotina e hábito em cima de fundações puramente ilusórias.
A Essência das Coisas
Nunca me conformei com um conceito puramente científico da Existência, ou aritmético-geométrico, quantitativo-extensivo. A existência não cabe numa balança ou entre os ponteiros dum compasso. Pesar e medir é muito pouco; e esse pouco é ainda uma ilusão. O pesado é feito de imponderáveis, e a extensão de pontos inextensos, como a vida é feita de mortes.
A realidade não está nas aparências transitórias, reflexos palpitantes, simulacros luminosos, um aflorar de quimeras materiais. Nem é sólida, nem líquida, nem gasosa, nem electromagnética, palavras com o mesmo significado nulo. Foge a todos os cálculos e a todos os olhos de vidro, por mais longe que eles vejam, ou se trate dum núcleo atómico perdido no infinitamente pequeno, ou da nebulosa Andrómeda, a seiscentos mil anos de luz da minha aldeia!
A essência das coisas, essa verdade oculta na mentira, é de natureza poética e não científica. Aparece ao luar da inspiração e não à claridade fria da razão. Esta apenas descobre um simples jogo de forças repetido ou modificado lentamente, gestos insubstanciais, formas ocas, a casca de um fruto proibido.
Mas o miolo é do poeta. Só ele saboreia a vida até ao mais íntimo do seu gosto amargoso,
A Razão da Minha Esperança
Meu bom amigo,
Sei que tens sofrido bastante.
Não posso esquecer que um dia me ensinaste: que leal é quem não abandona; que devemos procurar ser pessoas dignas de confiança, mais do que tentar encontrar alguém assim; e, que a vontade de amar já é, em si mesma, amor.
Permite-me que partilhe contigo, hoje, algumas ideias a respeito dos momentos difíceis…
São muitas as provas que na vida servem para testar quem somos, a força que temos em nós e o nosso valor. Algumas vezes uma pedra gigante vem cair mesmo diante de nós… outras vezes são séries infindáveis de pequenos obstáculos no caminho… longas etapas que nos obrigam a seguir adiante sem descansar, em percursos onde quase nunca se vê o horizonte.
A agitação permanente em que vivemos leva muitos a desistir de encontrar referências mais adiante, mas é preciso que nos afastemos do tempo para assim encontrarmos a posição mais segura, elevando-nos acima dos momentos passageiros para os compreender melhor. No meio da confusão é preciso ver para além do que se pode olhar… estabelecer os alicerces sobre o que é sólido, ainda que seja preciso escavar muito mais fundo do que o normal…
O Pressuposto Indispensável para se Ser um Grande-Escritor
O pressuposto indispensável para se ser um grande-escritor é, então, o de escrever livros e peças de teatro que sirvam para todos os níveis, do mais alto ao mais baixo. Antes de produzir algum bom efeito, é preciso primeiro produzir efeito: este princípio é a base de toda a existência como grande-escritor. É um princípio miraculoso, eficaz contra todas as tentações da solidão, por excelência o princípio goethiano do sucesso: se nos movermos apenas num mundo que nos é propício, tudo o resto virá por si. Pois quando um escritor começa a ter sucesso dá-se logo uma transformação significativa na sua vida. O seu editor pára de se lamentar e de dizer que um comerciante que se torna editor se parece com um idealista trágico, porque faria muito mais dinheiro negociando com tecidos ou papel virgem. A crítica descobre nele um objecto digno da sua actividade, porque os críticos muitas vezes até nem são más pessoas, mas, dadas as circunstâncias epocais pouco propícias, ex-poetas que precisam de um apoio do coração para poderem pôr cá fora os seus sentimentos;são poetas do amor ou da guerra, consoante o capital interior que têm de aplicar com proveito, e por isso é perfeitamente compreensível que escolham o livro de um grande-escritor e não o de um comum escritor.
Prazer Convicto ou sem Domínio
Quem age em vista do prazer e o persegue, por convicção e decisão, parece ser melhor do que quem não age por cálculo, mas por falta de domínio. Ou seja, o primeiro parece poder ser mais facilmente corrigido, porque pode ser convencido a alterar as suas convicções. Na verdade, o provérbio: «Se a água é capaz de sufocar, porque a bebemos?» parece poder aplicar-se a quem não se domina.
Se alguém age por ter sido convencido a fazer o que faz, deixará de o fazer se for convencido de outro modo. Contudo, estando ele agora convencido de que deve fazer uma coisa, ainda assim fará uma coisa diferente. Ainda, se perda de domínio e o autodomínio podem ser ditos a respeito de tudo na existência, quem é que existe com uma absoluta falta de domínio? Porque ninguém perde o domínio a respeito de tudo. Contudo, dizemos de alguns que têm uma falta de domínio absoluta.
A Natureza Subjectiva do Tempo
O tempo, tal como o espaço, é uma forma pura da intuição ou percepção sensível. É a condição de toda a percepção activa imediata, e também de tudo o que é percepcionado, isto é, de toda a experiência e de tudo o que é experimentado. A natureza é feita de tempo e de espaço, e é um processo. Quando salientamos o seu aspecto espacial, estamos conscientes da sua natureza objectiva; quando salientamos o seu aspecto temporal, tornamo-nos conscientes da sua natureza subjectiva. Tal como a percepcionamos, a natureza é um processo de devir infindável e contínuo. As coisas chegam e partem no tempo, mas são também temporais – o tempo é o seu modo de existência.
Para Além do Hoje
Cada vez mais se vive o momento. Fugimos do passado e temos medo do futuro, o que implica que somos forçados a viver um presente demasiado pequeno.
Os tempos de descanso devem ser ocasião de trabalho interior. Mas, vai sendo cada vez mais raro encontrar gente com memória, assim com também é raro encontrar pessoas com discernimento suficiente para se comprometerem em projetos a longo prazo.
Navega-se à vista… sem riscos, sem sucessos nem fracassos… sem sentido. Vamos dando as respostas mínimas ao mundo e aos outros, em vez de sermos protagonistas dos nossos sonhos e heróis apesar das nossas derrotas.
O passado e o futuro não são mentira. São partes da verdade. Sou o que fui e o que serei. Uma identidade que vive no tempo, uma coerência que se constrói através diferentes espaços e tempos, amando o que há de eterno em cada momento. Elevando o espírito acima da realidade concreta do mundo.Uma existência autêntica – uma vida com valor – constrói-se com uma estrutura sólida, equilibrada e aberta a horizontes mais longínquos em termos temporais. Um presente maior, com mais passado e mais futuro. Sermos quem somos, de olhos abertos.
Se Fosse Alguma Coisa, Não Poderia Imaginar
Monotonizar a existência, para que ela não seja monótona. Tornar anódino o quotidiano, para que a mais pequena coisa seja uma distracção. No meio do meu trabalho de todos os dias, baço, igual e inútil, surgem-me visões de fuga, vestígios sonhados de ilhas longínquas, festas em áleas de parques de outras eras, outras paisagens, outros sentimentos, outro eu.
Mas reconheço, entre dois lançamentos, que se tivesse tudo isso, nada disso seria meu.Mais vale, na verdade, o patrão Vasques que os Reis do Sonho; mais vale, na verdade, o escritório da Rua dos Douradores do que as grandes áleas dos parques impossíveis. Tendo o patrão Vasques, posso gozar a visão interior das paisagens que não existem. Mas se tivesse os Reis do Sonho, que me ficaria para sonhar? Se tivesse as paisagens impossíveis, que me restaria de possível ?
(…) Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar. O ajudante de guarda-livros pode sonhar-se imperador romano; o Rei de Inglaterra não o pode fazer, porque o Rei de Inglaterra está privado de o ser, em sonhos, outro rei que não o rei que é. A sua realidade não o deixa sentir.
Alma e Corpo – A Ilusão da Integridade
Em qualquer momento em que a consideremos, a nossa alma total tem sempre um valor quase fictício, apesar do numeroso balanço das suas riquezas, pois ora umas, ora outras, são indisponíveis, quer se trate de riquezas efectivas como de riquezas da imaginação… Pois as perturbações da memória estão ligadas às intermitências do coração.
É sem dúvida a existência do nosso corpo, semelhante para nós a um vaso em que estaria encerrada a nossa espiritualidade, que nos induz a supor que todos os nossos bens interiores, as alegrias passadas, todas as nossas dores, estão perpetuamente em nossa possessão.
Todos Pensam de Forma Diferente, e Muitas Vezes Efémera
Cada indivíduo vê o mundo – e o que este tem de acabado, de regular, de complexo e de perfeito – como se se tratasse apenas de um elemento da Natureza a partir do qual tivesse que constituir um outro mundo, particular, adaptado às suas necessidades. Os homens mais capazes tomam-no sem hesitações e procuram na medida do possível comportar-se de acordo com ele. Há outros que não se conseguem decidir e que ficam parados a olhar para ele. E há ainda os que chegam ao ponto de duvidar da existência do mundo.
Se alguém se sentisse tocado por esta verdade fundamental, nunca mais entraria em disputas e passaria a considerar, quer as representações que os outros possam fazer das coisas, quer a sua, como meros fenómenos. Porque de facto verificamos quase todos os dias que aquilo que um indivíduo consegue pensar com toda a facilidade pode ser impossível de pensar para um outro. E não apenas em relação a questões que tivessem uma qualquer influência no bem estar ou no sofrimento das pessoas, mas também a propósito de assuntos que nos são totalmente indiferentes.
Não se Consegue ser Exterior à Nossa Própria Indiferença
A dificuldade da existência estava precisamente neste problema concreto: por diversas vezes Walser se vira, ao longe, alegre, e também de longe observara a sua própria tristeza ou irritação. Nada de mais. Mas o que nunca conseguira era ser exterior à indiferença; ser exterior a si nos momentos, inúmeros, em que se encontrava neutro face às coisas, inerte e em estado de espera perante a possibilidade de um acto ou do seu contrário. Quanto mais intensidade existia no corpo, mais fácil era afastar-se, ser testemunha de si próprio. As dificuldades de observação privilegiada, de uma existência que lhe pertencia, surgiam assim, de um modo extremo, quando a intensidade dos sentimentos era quase nula. Se ele já lá não estava – na existência – como se poderia ainda afastar mais?
Mas o que era concretamente este lá, este outro sítio que por vezes parecia ser o seu centro outras vezes o seu oposto? Sobre a localização geral desse lá, Walser não tinha dúvidas: era o cérebro. Era ali que tudo se passava ou que tudo o que se passava era observado. Ali fazia, e ali via-se a fazer. Como qualquer louco normal, pensou Walser, e sorriu da fórmula.
Gonçalo M.
A (Des)Vantagem do Casamento
A verdadeira desvantagem do casamento é que nos despoja do egoísmo. E as pessoas que não são egoístas são absolutamente desinteressantes. Falta-lhes individualidade. Contudo, há certos temperamentos que se tornam mais complexos com o casamento. Mantêm o egotismo e acrescentam-lhe muitos outros egos. São obrigados a ter mais que uma vida. Tornam-se mais eficientes na sua disciplina, e uma organização eficiente é, segundo creio, o objectivo da existência do homem. Além disso, toda a experiência é válida e, por mais que se fale contra o casamento, não deixa de ser uma experiência.
A Única Realidade Social (2)
As qualidades puramente sociais que governam os homens são o egoísmo, a socialidade e a vaidade. Por socialidade entendo o instinto gregário; é ela que ameniza e limita, sem nunca o eliminar nem essencialmente o alterar, o egoísmo, qualidade primária, que se deriva da própria circunstância de haver um ego. A vaidade é a consequência do egoísmo na sua limitação pela sociedade; é a qualidade social humana mais evidente. Todo o homem quer ser mais que outro, todo o homem quer brilhar. Variam, com as índoles e as aptidões, as maneiras em que o homem quer destacar-se, mas cada um tem a sua vaidade.
Seria impossível a existência da sociedade se nela se não reproduzissem estes fenómenos da vida do indivíduo. Por isso a sociedade se divide em nações, e não é possível «humanidade» em matéria social. Assim como tem que haver um egoísmo individual, tem que haver um egoísmo colectivo – é o que se chama o instinto patriótico. Assim como há uma vaidade individual – tem que haver uma vaidade colectiva – é o que se chama imperalismo.
Destino, Acaso ou Coincidência
Podemos muito bem, se for esse o nosso desejo, vaguear sem destino pelo vasto mundo do acaso. Que é como quem diz, sem raízes, exactamente da mesma maneira que a semente alada de certas plantas esvoaça ao sabor da brisa primaveril.
E, contudo, não faltará ao mesmo tempo quem negue a existência daquilo a que se convencionou chamar o destino. O que está feito, feito está, o que tem se ser tem muita força e por aí fora. Por outras palavras, quer queiramos quer não, a nossa existência resume-se a uma sucessão de instantes passageiros aprisionados entre o «tudo» que ficou para trás e o «nada» que temos pela frente. Decididamente, neste mundo não há lugar para as coincidências nem para as probabilidades.
Na verdade, porém, não se pode dizer que entre esses dois pontos de vista exista uma grande diferença. O que se passa – como, de resto, em qualquer confronto de opiniões – é o mesmo que sucede com certos pratos culinários: são conhecidos por nomes diferentes mas, na prática, o resultado não varia.
A Glorificação das Aparências
Não sei o que acontecerá quando formos todos funcionários aureolados pela organização de aparências que acentua a satisfação dos privilégios. A aparência vai tomando conta até da vida privada das pessoas. Não importa ter uma existência nula, desde que se tenha uma aparência de apropriação dos bens de consumo mais altamente valorizados. Há de facto um novo proletariado preparado para passar por emancipação e conquistas do século. As bestas de carga carregam agora com a verdade corrente que é o humanismo em foco — a caricatura do humano e do seu significado.
O Acto de Criação é de Natureza Obscura
O acto de criação é de natureza obscura; nele é impossível destrinçar o que é da razão e o que é do instinto, o que é do mundo e o que é da terra. Nunca nenhum dualismo serviu bem o poeta. Esse «pastor do Ser», na tão bela expressão de Heidegger, é, como nenhum outro homem, nostálgico de uma antiga unidade. As mil e uma antinomias, tão escolarmente elaboradas, quando não pervertem a primordial fonte do desejo, pecam sempre por cindir a inteireza que é todo um homem. Não há vitória definitiva sem a reconciliação dos contrários. É no mar crepuscular e materno da memória, onde as águas «superiores» não foram ainda separadas das «inferiores», que as imagens do poeta sonham pela primeira vez com a precária e fugidia luz da terra.
Diante do papel, que «la blancheur défend», o poeta é uma longa e só hesitação. Que Ifigénia terá de sacrificar para que o vento propício se levante e as suas naves possam avistar os muros de Tróia? Que augúrios escuta, que enigmas decifra naquele rumor de sangue em que se debruça cheio de aflição? Porque ao princípio é o ritmo; um ritmo surdo, espesso, do coração ou do cosmos — quem sabe onde um começa e o outro acaba?
A Vida Real de um Pensamento
A vida real de um pensamento dura apenas até ele chegar ao limite das palavras: nesse ponto, ele lapidifica-se, morre, portanto, mas continua indestrutível, tal como os animais e as plantas fósseis dos tempos pré-históricos. Essa realidade momentânea da sua vida também pode ser comparada ao cristal, no instante da cristalização.
Pois, assim que o nosso pensamento encontra as palavras, ele já não é interno, nem está realmente no âmago da sua essência. Quando começa a existir para os outros, ele deixa de viver em nós, como o filho que se desliga da mãe ao iniciar a própria existência. Mas diz também o poeta:Não me confundais com contradições!
Tão logo se fala, já se começa a errar.
A Minha Luta
A minha luta é para encontrar o centro, o núcleo de toda uma infinidade de justificações, que superficialmente parecem satisfazer-me e são, afinal, folhas caducas do meu tronco. Determinar, numa palavra, que causa última me conduz, que força polariza os meus actos. Mas estou longe dessa descoberta. Eliminei o divino, porque era divino e eu sou humano; superei o pecado, porque viver sem pecado era um absurdo moral; e consegui perceber que a vida não é trágica por estar balizada pelo nascimento e pela morte, que são condições de existência e não condenações dela. Contudo, nada resolvi. Continua a escapar-me das mãos a sombra de um fantasma paradoxal. Uma sombra que é uma pura alucinação dos sentidos, que sabem que apenas o real lhes merece crédito, e, sobretudo, da razão, que sabe que a única consciência do mundo é ela própria, princípio e fim de si mesma.
O Homem – Um Ser Egoísta
O motor principal e fundamental no homem, bem como nos animais, é o egoísmo, ou seja, o impulso à existência e ao bem-estar. […] Na verdade, tanto nos animais quanto nos seres humanos, o egoísmo chega a ser idêntico, pois em ambos une-se perfeitamente ao seu âmago e à sua essência.
Desse modo, todas as acções dos homens e dos animais surgem, em regra, do egoísmo, e a ele também se atribui sempre a tentativa de explicar uma determinada acção. Nas suas acções baseia-se também, em geral, o cálculo de todos os meios pelos quais procura-se dirigir os seres humanos a um objectivo. Por natureza, o egoísmo é ilimitado: o homem quer conservar a sua existência utilizando qualquer meio ao seu alcance, quer ficar totalmente livre das dores que também incluem a falta e a privação, quer a maior quantidade possível de bem-estar e todo o prazer de que for capaz, e chega até mesmo a tentar desenvolver em si mesmo, quando possível, novas capacidades de deleite. Tudo o que se opõe ao ímpeto do seu egoísmo provoca o seu mau humor, a sua ira e o seu ódio: ele tentará aniquilá-lo como a um inimigo. Quer possivelmente desfrutar de tudo e possuir tudo;