Corremos Dentro dos Corpos
Como o sangue, corremos dentro dos corpos no momento em que abismos os puxam e devoram. Atravessamos cada ramo das ĂĄrvores interiores que crescem do peito e se estendem pelos braços, pelas pernas, pelos olhares. As raĂzes agarram-se ao coração e nĂłs cobrimos cada dedo fino dessas raĂzes que se fecham e apertam e esmagam essa pedra de fogo.
Como sangue, somos lĂĄgrimas. Como sangue, existimos dentro dos gestos. As palavras sĂŁo, tantas vezes, feitas daquilo que signiïŹcamos. E somos o vento, os caminhos do vento sobre os rostos. O vento dentro da escuridĂŁo como o Ășnico objecto que pode ser tocado. Debaixo da pele, envolvemos as memĂłrias, as ideias, a esperança e o desencanto.
Textos sobre Fogo de JosĂ© LuĂs Peixoto
2 resultadosEm Tudo o que Fiz Bem Pus um Pouco de Ti
Eis o teu rosto iluminado por esta hora de maio.
Ao filho autĂȘntico, basta fechar os olhos para encontrar o rosto da sua mĂŁe.
A fronteira que separa o dentro do fora Ă© vaga de propĂłsito, mais exata Ă© a fronteira dos meses.
MĂŁe, as tardes de maio nĂŁo sĂŁo um acaso.
Pus um pouco de ti naquilo que fiz de mais importante.
Onde existir terra estås tu, dås força e horizonte.
O ar não permitiria respiração se não te contivesse.
A ĂĄgua nĂŁo seria capaz de alimentar sem a tua presença lĂquida.
O fogo nĂŁo chegaria a acender se nĂŁo incluĂsse o teu mistĂ©rio no seu mistĂ©rio.
Estavas jĂĄ no primeiro inĂcio do firmamento, nesse rugido que encheu a superfĂcie do cĂ©u e da terra, que rasgou as trevas; da mesma maneira, estarĂĄs no seu Ășltimo fim.
EstĂĄs antes e depois.
EstĂĄs na lenta passagem da eternidade.
MĂŁe, atravessas a vida e a morte como a verdade atravessa o tempo, como os nomes atravessam aquilo que nomeiam.
Sabes que criei tudo o que hå e sabes também que não criei tudo o que poderia haver.
Entre as faltas evidentes,