ConsideraçÔes Sobre a Amizade

É a insuficiĂȘncia do nosso ser que faz nascer a amizade, e Ă© a insuficiĂȘncia da prĂłpria amizade que a faz perecer. EstĂĄ-se sozinho, sente-se a prĂłpria misĂ©ria, sente-se necessidade de apoio, procura-se quem lhe favoreça os gostos, um companheiro nos prazeres e nos pesares; quer-se um homem de quem se possa possuir o coração e o pensamento. EntĂŁo a amizade parece ser o que de mais doce hĂĄ no mundo; tem-se o que se desejou, logo se muda de ideia. Quando se vĂȘ de longe algum bem, ele fixa de inĂ­cio os nossos desejos, e quando se chega a ele, sente-se o seu nada. A nossa alma, de que ele prendia a vista na distĂąncia, nĂŁo pode repousar-se nele quando vĂȘ mais adiante: assim a amizade, que de longe limitava todas as nossas pretensĂ”es, cessa de limitĂĄ-las de perto; nĂŁo preenche o vazio que prometera preencher; deixa-nos necessidades que nos distraem e nos levam a outros bens.
EntĂŁo a gente torna-se negligente, difĂ­cil, exige-se logo como um tributo as complacĂȘncias que de inĂ­cio eram recebidas como um dom. É do carĂĄcter dos homens apropriar-se a pouco e pouco atĂ© das graças de que beneficiam; uma longa posse acostuma-os naturalmente a olhar as coisas que possuem como sendo deles;

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