A Dieta do Génio
Os meios de que JĂşlio CĂ©sar se serviu para se defender das doenças e das dores de cabeça: grandes caminhadas, um modo de vida simplĂssimo, permanĂŞncia constante ao ar livre, fadigas contĂnuas — estas sĂŁo, em grandes traços, as regras de conservação e defesa geral contra a extrema vulnerabilidade dessa máquina subtil, e que trabalha a uma altĂssima pressĂŁo, chamada gĂ©nio.
Textos sobre Génios de Friedrich Nietzsche
5 resultadosDuas Espécies de Génio
Há duas espĂ©cies de gĂ©nio: um que, antes de mais, fecunda e quer fecundar outros, e outro que prefere ser fecundado e parir. E da mesma maneira há entre os povos geniais aqueles a quem coube o problema feminino da gravidez e a missĂŁo secreta de formar, amadurecer e aperfeiçoar – os gregos, por exemplo, foram um povo desta espĂ©cie, assim como os franceses – ; e outros que tĂŞm de fecundar e ser a causa de novas ordens de vida, – como os judeus, os romanos e talvez, perguntando-se com toda a modĂ©stia, os alemĂŁes? – povos atormentados e extasiados com febres desconhecidas e irresistivelmente impelidos para fora de si prĂłprios, apaixonados e ávidos de raças estranhas (aqueles que se «deixam fecundar» -) e, com tudo isso, ávidos de domĂnio, como tudo o que se sabe cheio de força geradora e, por conseguinte, escolhido «pela graça de Deus». Estas duas espĂ©cies procuram-se como o homem e a mulher; mas tambĂ©m se dĂŁo mal mutuamente, – como o homem e a mulher.
Mais Vale Ser Surdo que Ensurdecido
Antigamente as pessoas queriam criar-se uma reputação: isso já não basta, a feira tornou-se demasiado vasta; agora é necessário vender aos berros. A consequência é que mesmo as melhores gargantas forçam a voz e as melhores mercadorias não são oferecidas por orgãos enrouquecidos; já não há génio, nos nossos dias, sem clamor e sem rouquidão. Época vil para o pensador: devemos aprender a encontrar entre duas barulheiras o silêncio de que se tem necessidade e a fingir de surdo até chegar a sê-lo. Enquanto não se tiver chegado a isso, corre-se o risco de perecer de impaciência e de dores de cabeça.
A Cautela dos EspĂritos Livres
Os homens de espĂrito livre, que vivem sĂł para o conhecimento, em breve acharĂŁo ter alcançado a sua definitiva posição relativamente Ă sociedade e ao Estado e, por exemplo, dar-se-ĂŁo de bom grado por satisfeitos com um pequeno emprego ou com uma fortuna que chega Ă justa para viver; pois arranjar-se-ĂŁo para viver de maneira que uma grande transformação dos bens materiais, atĂ© mesmo um derrube da ordem polĂtica, nĂŁo deite tambĂ©m abaixo a sua vida. Em todas essas coisas eles gastam a menor energia possĂvel, de modo a poderem imergir, com todas as forças reunidas e, por assim dizer, com um grande fĂ´lego, no elemento do conhecimento. Podem, assim, ter esperança de mergulhar profundamente e tambĂ©m de, talvez, verem bem atĂ© ao fundo.
De um dado acontecimento, um tal espĂrito pegará de bom grado sĂł numa ponta: ele nĂŁo gosta das coisas em toda a sua amplitude e superabundância das suas pregas, pois nĂŁo se quer emaranhar nelas. TambĂ©m ele conhece os dias de semana da falta de liberdade, da dependĂŞncia, da servidĂŁo. Mas, de tempos a tempos, tem de lhe aparecer um domingo de liberdade, senĂŁo ele nĂŁo suportará a vida. É provável que mesmo o seu amor pelos seres humanos seja cauteloso e com pouco fĂ´lego,
Retrocesso Civilizacional
SĂŁo talvez as prioridades dos nossos tempos que acarretam um retrocesso e uma eventual depreciação da vida contemplativa. Mas há que confessar que a nossa Ă©poca Ă© pobre em grandes moralistas, que Pascal, Epicteto, SĂ©neca, Plutarco pouco sĂŁo lidos ainda, que o trabalho e o esforço – outrora, no sĂ©quito da grande deusa SaĂşde – parecem, por vezes, grassar como uma doença. Porque faltam tempo para pensar e sossego no pensar, já nĂŁo se examina as opiniões diferentes: a gente contenta-se em odiá-las. Dada a enorme aceleração da vida, o espĂrito e o olhar sĂŁo acostumados a ver e a julgar parcial ou erradamente, e toda a gente se assemelha aos viajantes que ficam a conhecer um paĂs e um povo, vendo-os do caminho-de-ferro.
Uma atitude independente e cautelosa em matĂ©ria de conhecimento Ă© menosprezada quase como uma espĂ©cie de tolice, o espĂrito livre Ă© difamado, nomeadamente, por eruditos que, na sua arte de observar as coisas, sentem a falta da minĂşcia e do zelo de formigas que lhes sĂŁo prĂłprios, e bem gostariam de bani-lo para um canto isolado da ciĂŞncia: quando ele tem a missĂŁo, completamente diferente e superior, de comandar, a partir de uma posição solitária,