Textos sobre Ideias

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Textos de ideias escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Escrever é Esquecer

Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas (como a dança e o representar) entretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida – umas porque usam de fórmulas visíveis e portanto vitais, outras porque vivem da mesma vida humana.
Não é o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso.

O Transitório e o Duradouro

Lastimo os que atribuem grande importância ao tema do transitório das coisas e que se perdem em minudências terrenas sem valor. Porque nós existimos precisamente para transformar o transitório em duradouro, e tal só acontece quando somos capazes de apreciar ambas as coisas.

A vida, por mais vulgar que pareça ser, por mais que dê a ideia de se satisfazer com coisas triviais e quotidianas, nunca deixa de se ocupar atentamente, ainda que em silêncio, de certas exigências superiores e de procurar os meios necessários à respectiva satisfação.

Não há Casamento com Luxúria

No casamento a revitalização da luxúria só pode ser conseguida enfraquecendo e destruindo os seus laços. Quero dizer, amantes. É por isso que a luxúria se torna um pecado, pois está destinada a morrer, e se ainda se acende isso só acontece por causa das mulheres fora do casamento. É assim que chegamos à ideia original de pecado quando a luxúria é a inimiga do amor. A cópula entre marido e mulher não é pecaminosa porque é feita sem luxúria. Todos os casos extraconjugais são luxuriosos e por isso pecaminosos. Assim, todas as tentativas de reavivar a luxúria no casamento são más, incluindo o afastamento.
Porque reacender a luxúria por um curto período ameaça um casamento, sujeitando a esposa à tentação de adultério na separação. O casamento foi criado para destruir a paixão embora a princípio atraia com paixão. Calcar a paixão com a paixão.
O casamento seduz com a legitimidade e com a disponibilidade da luxúria. Ao fazermos o juramento de fidelidade, não suspeitamos que estamos também a renunciar à luxúria. O casamento foi criado para distrair as pessoas da luxúria com a ajuda da luxúria. Por isso, para bem de um casamento forte, tem se aguentar o seu desaparecimento.

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Civilização de Especialistas

A verdade é que hoje vivemos numa civilização de especialistas e que é vão todo o empenho de que seja de outro modo. Sob pena de não ser eficiente, o homem das artes, das ciências e das técnicas tem de se especializar, para que domine aqueles segredos de bibliografia ou de prática, e para que obtenha os jeitos e a forte concentração de pensamento que se tornam necessários para que se possa não só manejar o que se herdou mas acrescentar património para as gerações futuras. E, se é certo que por um lado o especialismo favorece aquela preguiça de ser homem que tanto encontramos no mundo, permite ele, por outro lado, aproveitar em tarefas úteis indivíduos que pouco brilhantes seriam no tratamento de conjuntos. O preço, porém, se tem naturalmente de pagar; paga-o o colectivo quando se queixa, e muito justamente, da falta de bons líderes, de homens com uma larga visão de conjunto, que saibam do trabalho de cada um o suficiente para o poderem dirigir e se tenham eles tornado especialistas na difícil arte de não ter especialidade própria senão essa mesma do plano, da previsão e do animar na batalha as tropas que, na maior parte das vezes,

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O Professor como Mestre

Não me basta o professor honesto e cumpridor dos seus deveres; a sua norma é burocrática e vejo-o como pouco mais fazendo do que exercer a sua profissão; estou pronto a conceder-lhe todas as qualidades, uma relativa inteligência e aquele saber que lhe assegura superioridade ante a classe; acho-o digno dos louvores oficiais e das atenções das pessoas mais sérias; creio mesmo que tal distinção foi expressamente criada para ele e seus pares. De resto, é sempre possível a comparação com tipos inferiores de humanidade; e ante eles o professor exemplar aparece cheio de mérito. Simplesmente, notaremos que o ser mestre não é de modo algum um emprego e que a sua actividade se não pode aferir pelos métodos correntes; ganhar a vida é no professor um acréscimo e não o alvo; e o que importa, no seu juízo final, não é a ideia que fazem dele os homens do tempo; o que verdadeiramente há-de pesar na balança é a pedra que lançou para os alicerces do futuro.
A sua contribuição terá sido mínima se o não moveu a tomar o caminho de mestre um imenso amor da humanidade e a clara inteligência dos destinos a que o espírito o chama;

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Dependência do Governo

Diz-se geralmente que, em Portugal, o público tem ideia de que o Governo deve fazer tudo, pensar em tudo, iniciar tudo: tira-se daqui a conclusão que somos um povo sem poderes iniciadores, bons para ser tutelados, indignos de uma larga liberdade, e inaptos para a independência. A nossa pobreza relativa é atribuída a este hábito político e social de depender para tudo do Governo, e de volver constantemente as mãos e os olhos para ele como para uma Providência sempre presente.

Entender, mais pelo Sentir que pela Razão

Uma verdade só o é quando sentida – não quando apenas entendida. Ficamos gratos a quem no-la demonstra para nos justificarmos como humanos perante os outros homens e entre eles nós mesmos. Mas a força dessa verdade está na força irrecusável com que nos afirmamos quem somos antes de sabermos porquê.
Assim nos é necessário estabelecer a diferença entre o que em nós é centrífugo e o que apenas é centrípeto. Nós somos centrifugamente pela irrupção inexorável de nós com tudo o que reconhecido ou não – e de que serve reconhecê-lo ou não? – como centripetamente provindo de fora, se nos recriou dentro no modo absoluto e original de se ser.
Só assim entenderemos que da «discussão» quase nunca nasça a «luz», porque a luz que nascer é normalmente a de duas pedras que se chocam. Da discussão não nasce a luz, porque a luz a nascer seria a que iluminasse a obscuridade de nós, a profundeza das nossas sombras profundas.
Decerto uma ideia que nos semeiem pode germinar e por isso as ideias é necessário que no-las semeiem. Mas a sua fertilidade não está na nossa mão ou na estrita qualidade da ideia semeada, porque o que somos profundamente só se altera quando isso que somos o quer –

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Não se Reconquista o Amor com Argumentos

Não te esqueças de que a tua frase é um acto. Se desejas levar-me a agir, não pegues em argumentos. Julgas que me deixarei determinar por argumentos? Não me seria difícil opor, aos teus, melhores argumentos.
Já viste a mulher repudiada reconquistar-te através de um processo em que ela prova que tem razão? O processo irrita. Ela nem sequer será capaz de te recuperar mostrando-te tal como tu a amavas, porque essa já tu a não amas. Olha aquela infeliz que, nas vésperas do divórcio, teve a ideia de cantar a mesma canção triste que cantava quando noiva. Essa canção triste ainda tornou o homem mais furioso.
Talvez ela o recuperasse se o conseguisse despertar tal como ele era quando a amava. Mas para isso precisaria de um génio criador, porque teria de carregar o homem de qualquer coisa, da mesma maneira que eu o carrego de uma inclinação para o mar que fará dele construtor de navios. Só assim cresceria essa árvore que depois se iria diversificando. E ele havia de pedir de novo a canção triste.
Para fundar o amor por mim, faço nascer em ti alguém que é para mim. Não te confessarei o meu sofrimento,

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Alimentar o Ego

Para quem faz do sonho a vida, e da cultura em estufa das suas sensações uma religião e uma política, para esse primeiro passo, o que acusa na alma que ele deu o primeiro passo, é o sentir as coisas mínimas extraordinária — e desmedidamente. Este é o primeiro passo, e o passo simplesmente primeiro não é mais do que isto. Saber pôr no saborear duma chávena de chá a volúpia extrema que o homem normal só pode encontrar nas grandes alegrias que vêm da ambição subitamente satisfeita toda ou das saudades de repente desaparecidas, ou então nos actos finais e carnais do amor; poder encontrar na visão dum poente ou na contemplação dum detalhe decorativo aquela exasperação de senti-los que geralmente só pode dar, não o que se vê ou o que se ouve, mas o que se cheira ou se gosta — essa proximidade do objecto da sensação que só as sensações carnais — o tacto, o gosto, o olfacto – esculpem de encontro à consciência; poder tornar a visão interior, o ouvido do sonho — todos os sentidos supostos e do suposto — recebedores e tangíveis como sentidos virados para o externo: escolho estas, e as análogas suponham-se,

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Mensagem a Alunos e Professores

A arte mais importante do professor é a de despertar a alegria pelo trabalho e pelo conhecimento.
«Queridos estudantes!
Regozijo-me por vos ver hoje diante de mim, alegre juventude de um país abençoado.
Lembrai-vos de que as coisas maravilhosas que ireis aprender nas vossas escolas são a obra de muitas gerações, levada a cabo por todos os países do mundo, à custa de muito entusiasmo, muito esforço e muita dor. Tudo é depositado nas vossas mãos, como uma herança, para que a aceitem, honrem, desenvolvam e a transmitam fielmente um dia aos vossos filhos. Assim nós, embora mortais, somos imortais nas obras duradouras que criamos em comum.
Se tiverem esta ideia sempre em mente, encontrarão algum sentido na vida e no trabalho e poderão formar uma opinião justa em relação aos outros povos e aos outros tempos.»

A Mocidade Propõe, a Maturidade Dispõe

É função da mocidade ser profundamente sensível às novas ideias como instrumentos rápidos para dominar o meio; e é função da idade madura opor-se tenazmente a essas ideias ; isso faz com que as inovações fiquem em experiência por algum tempo antes que a sociedade as ponha em prática. A maturidade atenua as ideias novas, redu-las de modo a caberem dentro da possibilidade ou a que só se realizem em parte. A mocidade propõe, a maturidade dispõe, a velhice opõe-se. A mocidade domina nos períodos revolucionários; a maturidade, nos períodos de reconstrução; a velhice, nos períodos de estagnação. «Dá-se com os homens», diz Nietzsche, «o mesmo que com as carvoarias na floresta. Só depois que a mocidade se carboniza é que se torna utilizável. Enquanto está a arder será muito interessante, mas incómoda e inútil.»

Combater é uma Diminuição

Combater é, em termos absolutos, uma diminuição. O homem, quer defenda a pátria, quer defenda as ideias, desde que passa os dias aos tiros ao vizinho, mesmo que o vizinho seja o monstro dos monstros, está a perder grandeza. Sempre que por qualquer motivo a razão passou a servir a paixão, houve um apoucamento do espirito, e é difícil que o espírito se salve num processo onde ele entra diminuído. Mas quando numa comunidade alguém endoidece e desata a ferir a torto e a direito, é preciso dominar o possesso de qualquer forma, e a guerra é fatal. Então, embora sabendo que vai empobrecer a sua alma, o homem normal começa a lutar, e só a morte ou o triunfo o podem fazer parar. É trágico, mas é natural. O que é contra todas as leis da vida é ficar ao lado da contenda como espectador. Sendo uma diminuição combater, é uma traição sem nome lavar as mãos do conflito, e passar as horas de binóculo assestado a contemplar a desgraça do alto dum monte. Assim é que nada se salva. Fica-se homem sem qualquer sentido, manequim vestido de gente, coisa que não tem personalidade. Porque nem se representa a inteligência,

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Arriscar Tem a Ver com Confiança

Arriscar tem a ver com confiança. Uma pessoa sem confiança vai tentar repetir, fazer igual aos outros, não cometer erros, que é uma ideia muito valorizada. Mas o erro está ligado à descoberta. É fundamental não ter medo nenhum do erro. O que é o erro? Eu tinha previsto ir numa determinada direcção e não fui, errei. O erro é encontrar alguma coisa, algo que se cruza com o novo, o criativo.

Gonçalo M.

O Triunfo dos Imbecis

Não nos deve surpreender que, a maior parte das vezes, os imbecis triunfem mais no mundo do que os grandes talentos. Enquanto estes têm por vezes de lutar contra si próprios e, como se isso não bastasse, contra todos os medíocres que detestam toda e qualquer forma de superioridade, o imbecil, onde quer que vá, encontra-se entre os seus pares, entre companheiros e irmãos e é, por espírito de corpo instintivo, ajudado e protegido. O estúpido só profere pensamentos vulgares de forma comum, pelo que é imediatamente entendido e aprovado por todos, ao passo que o génio tem o vício terível de se contrapor às opiniões dominantes e querer subverter, juntamente com o pensamento, a vida da maioria dos outros.
Isto explica por que as obras escritas e realizadas pelos imbecis são tão abundante e solicitamente louvadas – os juízes são, quase na totalidade, do mesmo nível e dos mesmos gostos, pelo que aprovam com entusiasmo as ideias e paixões medíocres, expressas por alguém um pouco menos medíocre do que eles.
Este favor quase universal que acolhe os frutos da imbecilidade instruída e temerária aumenta a sua já copiosa felicidade. A obra do grande, ao invés, só pode ser entendida e admirada pelos seus pares,

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O País é Pequeno e a Gente que nele Vive também não é Grande

Em tempos disse que Portugal estava culturalmente morto. Talvez o tenha dito em determinado momento, mas também o diria hoje porque Portugal não tem ideias de futuro, nenhuma ideia do futuro português, nem uma ideia que seja sua, e vai navegando ao sabor da corrente. A cultura, apesar de tudo, tem sobrevivido e é aquilo que pode dar do país uma imagem aberta e positiva em todos os aspectos, seja no cinema, na literatura ou na arte – temos grandes pintores que andam espalhados pelo mundo. Mas o Almeida Garrett definiu-nos de uma vez para sempre e de uma maneira que se tem de reconhecer que é uma radiografia de corpo inteiro: «O país é pequeno e a gente que nele vive também não é grande.» É tremenda esta definição, mas se tivermos ocasião de verificar, desde o tempo do Almeida Garrett e, projectando para trás, efectivamente o país é pequeno (…), mas o que está em causa não é o tamanho físico do país mas a dimensão espiritual e mental dos seus habitantes.

O Objectivo da Arte não é Ser Compreensível

Toda a arte é expressão de qualquer fenómeno psíquico. A arte, portanto, consiste na adequação, tão exacta quanto caiba na competência artística do fautor, da expressão à cousa que quer exprimir. De onde se deduz que todos os estilos são admissíveis, e que não há estilo simples nem complexo, nem estilo estranho nem vulgar.
Há ideias vulgares e ideias elevadas, há sensações simples e sensações complexas; e há criaturas que só têm ideias vulgares, e criaturas que muitas vezes têm ideias elevadas. Conforme a ideia, o estilo, a expressão. Não há para a arte critério exterior. O fim da arte não é ser compreensível, porque a arte não é a propaganda política ou imoral.

A Alma e o Génio

O que faz de um homem um homem de génio – ou melhor o que eles fazem – não são as ideias novas mas essa ideia, que nunca os larga, que o que já foi dito não o foi nunca suficientemente.
(…) O que tortura a minha alma é a sua solidão. Quanto mais ela se dispersa pelos amigos e os prazeres comezinhos, mais esta me foge e se esconde na sua fortaleza. A novidade encontra-se no espírito que cria e não na nautreza reproduzida.

Tu que sabes que o novo existe sempre, mostra-o aos outros – no que eles nunca souberam ver. Faz-lhes compreender que nunca tinham ouvido falar do rouxinol, do espectáculo do mar imenso ou de tudo aquilo que os seus grosseiros órgãos só se encontram em condições de desfrutar depois de se ter tido o trabalho de sentir por eles.
E não faças da língua um empecilho, porque se cuidares da tua alma ela arranjará forma de se dar a entender. Criará uma nova linguagem que valerá os hemistíquios deste ou a prosa daquele. O quê?, diz-me que se considera uma pessoa original e fica insensível à leitura de Byron ou de Dante?

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Olhar para as Coisas com alguma Distância

Percorrendo as ruas fui descobrindo coisas espantosas que lá ocorriam desde sempre, disfarçadas sob uma máscara ténue de normalidade: um viúvo que, depois de se reformar, passava as tardes sentado no carro, a porta aberta, a perna esquerda fora, a direita dentro; um sujeito tão magro que se podia tomar por uma figura de cartão, ideia reforçada por andar de bicicleta e, sobretudo, por nela carregar o papelão que recolhia nos contentores do lixo; a mulher que, com uma regularidade cronométrica, vinha à janela, olhava para um lado e para o outro, como se aguardasse há muito a chegada de alguém. Eram três exemplos de situações que – creio ser esta a melhor formulação – aconteciam desde sempre e pela primeira vez. Se olharmos para as coisas com alguma distância, retirando-as do contexto, deixando-nos contaminar pela estranheza, tudo, tudo mesmo, adquire uma aura macabra e repetitiva, singular, reconhecível, que se mistura com a substância dos sonhos, a matéria das mentes perturbadas. Penso sempre, não sei porque, que talvez a resposta esteja naquela revista antiga que não resistiu às traças: nos sobreviventes de Hiroxima, no clarão absoluto que os cegou, no mundo irreal em que foram condenados a viver a partir desse momento,

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Saber Falar às Multidões

Longos discursos, agitar de punhos, socos na mesa, e resoluções expressas com emoção mas desligadas das condições objectivas, não produzem acção de massas e podem provocar grande dano à organização e à luta que servimos.
(…) Há uma fase na vida de todo o reformador social em que ele troveja nas tribunas, principalmente para se livrar de informação mal digerida que se lhe acumulou na cabeça, uma tentativa para impressionar as multidões, em vez de iniciar uma exposição calma e simples de princípios e ideias, cuja verdade universal se evidencia pela experiência pessoal e estudo mais aprofundado.

O Campo da Experiência Nunca nos Satisfaz

Sendo todos os princípios do nosso entendimento apenas aplicáveis a objectos da experiência possível, toma-se evidente que todo raciocínio racional, que se aplica às coisas situadas fora das condições da experiência, ao invés de alcançar a verdade, apenas deve necessariamente chegar a uma aparência e a uma ilusão.
Mas o que caracteriza tal ilusão é que ela é inevitável (…) a tal ponto que, mesmo quando já nos apercebemos da sua falsidade, nos não podemos libertar dela. (…) De facto, o campo da experiência nunca nos satisfaz. (…) A nossa razão, para se satisfazer, deve, pois, necessariamente, tentar ultrapassar os limites da experiência e, por consequência, persuadir-se infalivelmente de que por esse caminho alcançará a extensão e a integralidade dos seus conhecimentos, coisa que ela não pode encontrar no campo dos fenómenos. Mas esta persuasão é uma ilusão completa: estando totalmente para além dos limites da nossa experiência sensível todos os conceitos e princípios do entendimento, e não podendo então ser aplicados a qualquer objecto, a razão ilude-se a si mesma quando atribui um valor objectivo a máximas completamente subjectivas, que, na realidade, apenas admite para sua própria satisfação.
(…) Todos os nossos raciocínios que pretendem sair do campo da experiência são ilusórios e infundamentados.

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