Verosimilhança não é Verdade
Quase sempre as suspeitas nos inquietam; somos sempre o joguete desses boatos de opiniĂŁo, que tantas vezes põe em fuga um exĂ©rcito, quanto mais um simples indivĂduo. (…) nĂłs rendemo-nos prontamente Ă opiniĂŁo. NĂŁo fazemos a crĂtica das razões que nos levam ao temor, nĂŁo as esquadrinhamos. Perdemos todo o sangue-frio, batemos em retirada, como os soldados expulsos do seu campo Ă vista da nuvem de poeira que levanta uma tropa a galope, ou tomados de terror colectivo por causa de um boato semeado sem garante.
NĂŁo sei como, mas as falsidades perturbam-nos desde logo. A verdade traz consigo a sua prĂłpria medida; tudo quanto se funda sobre uma incerteza, porĂ©m, fica entregue Ă conjectura e Ă s fantasias de um espĂrito perturbado.
Eis porque, entre as mais diversas formas do medo, nĂŁo há outra mais desastrosa, mais incoercĂvel que o medo pânico. Nos casos ordinários, a reflexĂŁo Ă© falha; nestes, a inteligĂŞncia está ausente.
Interroguemos, pois, cuidadosamente a realidade. É verosĂmil que uma desgraça venha a produzir-se? Verosimilhança nĂŁo Ă© verdade. Quantos acontecimentos ocorreram sem que os esperássemos! Quantos acontecimentos esperados que jamais ocorreram! Mesmo que venham a produzir-se, que Ă© que lucraremos em nos anteciparmos Ă nossa dor?
Textos sobre Incerteza de SĂ©neca
3 resultadosO Temor Combate-se com a Esperança
NĂŁo haverá razĂŁo para viver, nem termo para as nossas misĂ©rias, se fĂ´r mister temer tudo quanto seja temĂvel. Neste ponto, põe em acção a tua prudĂŞncia; mercĂŞ da animosidade de espĂrito, repele inclusive o temor que te acomete de cara descoberta. Pelo menos, combate uma fraqueza com outra: tempera o receio com a esperança. Por certo que possa ser qualquer um dos riscos que tememos, Ă© ainda mais certo que os nossos temores se apaziguam, quando as nossas esperanças nos enganam.
Estabelece equilĂbrio, pois, entre a esperança e o temor; sempre que houver completa incerteza, inclina a balança em teu favor: crĂŞ no que te agrada. Mesmo que o temor reuna maior nĂşmero de sufrágios, inclina-a sempre para o lado da esperança; deixa de afligir o coração, e figura-te, sem cessar, que a maior parte dos mortais, sem ser afectada, sem se ver seriamente ameaçada por mal algum, vive em permanente e confusa agitação. É que nenhum conserva o governo de si mesmo: deixa-se levar pelos impulsos, e nĂŁo mantĂ©m o seu temor dentro de limites razoáveis. Nenhum diz:
– Autoridade vĂŁ, espĂrito vĂŁo: ou inventou, ou lho contaram.
Flutuamos ao mĂnimo sopro. De circunstâncias duvidosas,
A Adversidade Ă© Essencial
PorquĂŞ espantar-nos que possa ser vantajoso, por vezes mesmo desejável, expor-nos ao fogo, Ă s feridas, Ă morte, Ă prisĂŁo? Para o homem esbanjador a austeridade Ă© um castigo, para o preguiçoso o trabalho equivale a um suplĂcio; ao efeminado toda a labuta causa dĂł, para o indolente qualquer esforço Ă© uma tortura: pela mesma ordem de ideias toda a actividade de que nos sentimos incapazes se nos afigura dura e intolerável, esquecendo-nos de que para muitos Ă© uma autĂŞntica tortura passar sem vinho ou acordar de madrugada! Qualquer destas situações nĂŁo Ă© difĂcil por natureza, os homens Ă© que sĂŁo moles e efeminados!
Para formar juĂzos de valor sobre as grandes questões há que ter uma grande alma, pois de outro modo atribuiremos Ă s coisas um defeito que Ă© apenas nosso, tal como objectos perfeitamente direitos nos parecem tortos e partidos ao meio quando os vemos metidos dentro de água. O que interessa nĂŁo Ă© o que vemos, mas o modo como o vemos; e no geral o espĂrito humano mostra-se cego para a verdade!
Indica-me um jovem ainda incorrupto e de espĂrito alerta, e ele nĂŁo hesitará em julgar mais afortunado o homem capaz de suportar todo o peso da adversidade sem dobrar os ombros,