A Leitura Ă© a Maior das Amizades
A amizade, a amizade que diz respeito aos indivĂduos, Ă© sem dĂşvida uma coisa frĂvola, e a leitura Ă© uma amizade. Mas pelo menos Ă© uma amizade sincera, e o facto de ela se dirigir a um morto, a uma pessoa ausente, confere-lhe algo de desinteressado, de quase tocante. E alĂ©m disso uma amizade liberta de tudo quanto constitui a fealdade dos outros. Como nĂŁo passamos todos, nĂłs os vivos, de mortos que ainda nĂŁo entraram em funções, todas essas delicadezas, todos esses cumprimentos no vestĂbulo a que chamamos deferĂŞncia, gratidĂŁo, dedicação e a que misturamos tantas mentiras, sĂŁo estĂ©reis e cansativas. AlĂ©m disso, — desde as primeiras relações de simpatia, de admiração, de reconhecimento, as primeiras palavras que escrevemos, tecem Ă nossa volta os primeiros fios de uma teia de hábitos, de uma verdadeira maneira de ser, da qual já nĂŁo conseguimos desembaraçar-nos nas amizades seguintes; sem contar que durante esse tempo as palavras excessivas que pronunciámos ficam como letras de câmbio que temos que pagar, ou que pagaremos mais caro ainda toda a nossa vida com os remorsos de as termos deixado protestar. Na leitura, a amizade Ă© subitamente reduzida Ă sua primeira pureza.
Com os livros,
Textos sobre IndivĂduo de Marcel Proust
2 resultados Textos de indivĂduo de Marcel Proust. Leia este e outros textos de Marcel Proust em Poetris.
Coragem Aparente
O soldado está convencido de que tem diante de si um espaço de tempo infinitamente adiável antes que o matem; o ladrĂŁo, antes que o prendam; o homem, em geral, antes que o arrebate a morte. Esse Ă© o amuleto que preserva os indivĂduos – e Ă s vezes os povos – nĂŁo do perigo, mas do medo ao perigo; na verdade, da crença no perigo, motivo pelo qual o desafiam em certos casos, sem que sejam necessariamente bravos.