O Mal em Mim
NĂŁo sou capaz de explicar a sensação do mal em mim; representava, nesse perĂodo da minha vida de que falo, a fonte de uma angĂşstia inexprimĂvel. Os homens constroem teorias estranhas sobre o bem e o mal, sobre os castigos e as recompensas; procuram assim a verdade que nunca em vida poderĂŁo saber.
Foi muito bom para mim e para a minha famĂlia o facto de eu ter sempre ficado em casa e conservado sem esforço o meu antigo modo de ser calmo atĂ© aos quinze anos. Nessa altura, porĂ©m, mandaram-me para uma escola longe da minha casa, onde o ser latente em mim que tanto temia despertou e começou a agir e a insinuar-se na vida humana.
Quando digo que sentia haver muito mal dentro de mim, nĂŁo quero dizer que estivesse desde sempre condenado a uma vida de infâmia ou de vĂcio. Quero dizer, porĂ©m, isto — que havia em mim uma forte atracção por todas as coisas censuráveis que assediam o homem: podia controlar ou podia satisfazer esta atracção, mas uma vez satisfeita, mesmo sĂł um pouco, era provável que eu nunca mais me pudesse controlar. Resolvi satisfazer essa atracção, e a partir desse momento,
Textos sobre Infâmia de Fernando Pessoa
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