Amo-te
Talvez nĂŁo seja prĂłprio vir aqui, para as páginas deste livro, dizer que te amo. NĂŁo creio que os leitores deste livro procurem informações como esta. No mundo, há mais uma pessoa que ama. Qual a relevância dessa notĂcia? Ă€ sombra do guarda-sol ou de um pinheiro de piqueniques, os leitores nĂŁo deverĂŁo impressionar-se demasiado com isso. Depois de lerem estas palavras, os seus pensamentos instantâneos poderĂŁo diluir-se com um olhar em volta. Para eles, este texto será como iniciais escritas por adolescentes na areia, a onda que chega para cobri-las e apagá-las. E possĂvel que, perante esta longa afirmação, alguns desses leitores se indignem e que escrevam cartas de protesto, que reclamem junto da editora. Dou-lhes, desde já, toda a razĂŁo.
Eu sei. Talvez não seja próprio vir aqui dizer aquilo que, de modo mais ecológico, te posso afirmar ao vivo, por email, por comentário do facebook ou mensagem de telemóvel, mas é tão bom acreditar, transporta tanta paz. Tu sabes. Extasio-me perante este agora e deixo que a sua imensidão me transcenda, não a tento contrariar ou reduzir a qualquer coisa explicável, que tenha cabimento nas palavras, nestas pobres palavras. Em vez disso, desfruto-a, sorrio-lhe. Não estou aqui com a expectativa de ser entendido.
Textos sobre Iniciais de JosĂ© LuĂs Peixoto
2 resultadosO Outono da Vida
Começa devagarinho. É como tudo. A gente andamos na nossa vida, andamos influĂdos e está claro que nĂŁo reparamos. De manhĂŁ, temos de pensar no cafĂ©.
Depois, há-de vir o almoço. Está claro que nem reparamos numa aragem. Mal uma aragem mais fresca que se mistura com o sol-pĂ´r. Já setembro quer acabar e ainda temos a torrina do sol na pele, a hora do calor, (quase cansada, para a cadela invisĂvel) Anda cá, Ladina… TambĂ©m estás a ficar velha… Arriba, cadela… (voltando ao tom e Ă direcção inicial) A gente nem dá fĂ©. Primeiro, Ă© umas pontadas nas costas, umas sezões, umas coisas assim. Primeiro, a gente julga que vai passar, como passavam os esfolões nas pernas quando Ă©ramos pequenos e andávamos a correr pelas ruas ou quando encontrávamos alguma árvore a jeito de subir. Começa mesmo devagarinho. Aos poucos, (com ternura, para a cadela) Ah, Ladina… Bochinha, bochinha… EntĂŁo, nĂŁo queres vir? Anda cá, cadela… (voltando Ă direcção inicial) E as mĂŁos começam a tremer um bocadinho. E o trabalho começa a ser mais custoso. E um dia a gente já quase que nĂŁo conhece a nossa cara no espelho no lavatĂłrio. É nesse dia, Ă© nessa hora que começa o outono.