As Infelizes Necessidades do Homem Civilizado
Um autor célebre, calculando os bens e os males da vida humana, e comparando as duas somas, achou que a última ultrapassa muito a primeira, e que tomando o conjunto, a vida era para o homem um péssimo presente. Não fiquei surpreendido com a conclusão; ele tirou todos os seus raciocínios da constituição do homem civilizado. Se subisse até ao homem natural, pode-se julgar que encontraria resultados muito diferentes; porque perceberia que o homem só tem os males que se criou para si mesmo, o que à natureza se faria justiça. Não foi fácil chegarmos a ser tão desgraçados. Quando, de um lado, consideramos o imenso trabalho dos homens, tantas ciências profundas, tantas artes inventadas, tantas forças empregadas, abismos entulhados, montanhas arrasadas, rochedos quebrados, rios tornados navegáveis, terras arroteadas, lagos cavados, pantanais dissecados, construções enormes elevadas sobre a terra, o mar coberto de navios e marinheiros, e quando, olhando do outro lado, procuramos, meditando um pouco as verdadeiras vantagens que resultaram de tudo isso para a felicidade da espécie humana, só nos podemos impressionar com a espantosa desproporção que reina entre essas coisas, e deplorar a cegueira do homem, que, para nutrir o seu orgulho louco, não sei que vã admiração de si mesmo,
Textos sobre Loucos de Jean-Jacques Rousseau
2 resultadosA Verdade Universal Não Existe
Consultei os filósofos, folheei os seus livros, examinei as suas diversas opiniões; achei-os todos orgulhosos, afirmativos, dogmáticos – mesmo no seu pretenso cepticismo -, não ignorando nada, não demonstrando nada, troçando uns dos outros; e esse ponto, que é comum a todos eles, pareceu-me ser o único em que todos concordavam. Triunfantes quando atacam, não têm vigor quando se defendem. Se examinais as suas razões, só as têm para destruir; se contais os seus caminhos, cada um está limitado ao seu; só se põem de acordo para discutir; prestar-lhes ouvidos não era o meio de me livrar da minha incerteza. Compreendi que a insuficiência do espírito humano é a primeira causa dessa prodigiosa diversidade de sentimentos, e que o orgulho é a segunda.
Nós não temos a medida dessa imensa máquina, não podemos calcular as suas proporções; não lhe conhecemos nem as primeiras leis nem a causa final; ignoramo-nos a nós mesmos; não conhecemos nem a nossa natureza nem o nosso princípio activo; mal sabemos se o homem é um ser simples ou composto: mistérios impenetráveis rodeiam-nos por todos os lados; pairam por cima da região sensível; para os compreendermos, supomos ter inteligência, e apenas temos imaginação. Cada um de nós abre através desse mundo imaginário –