Os Professores
O mundo nĂŁo nasceu connosco. Essa ligeira ilusĂŁo Ă© mais um sinal da imperfeição que nos cobre os sentidos. ChegĂĄmos num dia que nĂŁo recordamos, mas que celebramos anualmente; depois, pouco a pouco, a neblina foi-se desfazendo nos objectos atĂ© que, por fim, conseguimos reconhecer-nos ao espelho. Nessa idade, nĂŁo sabĂamos o suficiente para percebermos que nĂŁo sabĂamos nada. Foi entĂŁo que chegaram os professores. Traziam todo o conhecimento do mundo que nos antecedeu. Lançaram-se na tarefa de nos actualizar com o presente da nossa espĂ©cie e da nossa civilização. Essa tarefa, sabemo-lo hoje, Ă© infinita.
O material que Ă© trabalhado pelos professores nĂŁo pode ser quantificado. NĂŁo hĂĄ nĂșmeros ou casas decimais com suficiente precisĂŁo para medi-lo. A falta de quantificação nĂŁo Ă© culpa dos assuntos inquantificĂĄveis, Ă© culpa do nosso desejo de quantificar tudo. Os professores nĂŁo vendem o material que trabalham, oferecem-no. NĂłs, com o tempo, com os anos, com a distĂąncia entre nĂłs e nĂłs, somos levados a acreditar que aquilo que os professores nos deram nos pertenceu desde sempre. Mais do que acharmos que esse material Ă© nosso, achamos que nĂłs prĂłprios somos esse material. Por ironia ou capricho, Ă© nesse momento que o trabalho dos professores se efectiva.
Textos sobre NĂșmeros de JosĂ© LuĂs Peixoto
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