Os Convencidos da Vida
Todos os dias os encontro. Evito-os. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas tambĂ©m os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaĂstas, crĂticos (de cinema, meu Deus, de cinema!). Será que voltaram os polĂgrafos? Voltaram, pois, e em força.
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.
Praticam, uns com os outros, nada de genuinamente indecente: apenas um espelhismo lisonjeador. Além de espectadores, o convencido precisa de irmãos-em-convencimento. Isolado, através de quem poderia continuar a convencer-se, a propagar-se?
(…) No corre-que-corre, o convencido da vida nĂŁo Ă© um vaidoso Ă toa. Ele Ă© o vaidoso que quer extrair da sua vaidade, que nunca Ă© gratuita, todo o rendimento possĂvel. Nos negĂłcios, na polĂtica, no jornalismo, nas letras, nas artes. É tĂŁo capaz de aceitar uma condecoração como de rejeitá-la.
Textos sobre Obras de Alexandre O'Neill
3 resultadosDesaprender
Há uma altura em que, depois de se saber tudo, tem de se desaprender. Sucede assim com o escrever. Com o escrever do escritor, entenda-se. Eu, provavelmente poeta, estou a aprender a… desaprender. E para quĂŞ e como se desaprende? Para deixar de ronronar, para que o leitor, quando o nosso produto lhe chega Ă s mĂŁos, nĂŁo exclame, satisfeito ou enfastiado: «- Cá está ele!».
Na verdura dos seus anos, a preocupação do escritor parece ser a da originalidade. Ser-se original é mostrar-se que se é diferente. E as pessoas gostam das primeiras piruetas que um sujeito dá. E o sujeito gosta de que as pessoas vejam nele um talento.
Atenção, vêm aà as receitas, as ideias feitas, os passes de mão, os clichés, os lugares selectos ou, mais comezinhamente, os lugares comuns. O escritor está instalado. Revê-se na sua obra. Começa a abalançar-se a voos mais altos, a mergulhos mais fundos. É a intelectualidade que o chama ao seu seio, o público que o põe, vertical, nas suas prateleiras. Arrumado.
Quase sem dar por isso, o escritor acomodou-se e tornou-se cĂłmodo, quando propendia, nos seus verdes anos, a incomodar-se e a tornar-se incĂłmodo. Organiza «dossiers» com os recortes das crĂticas que lhe fizeram ao longo da sua carreira (nome,
Besta Célere
Há quem lhe chame, por brincadeira, besta cĂ©lere para caracterizar a qualidade mediana (tomada por mĂ©dia) desse produto cultural (agora Ă© tudo cultural!) e, ao mesmo tempo, a rapidez com que ele se esgota em sucessivas edições. O best-seller Ă© um produto perfeita (ou eficazmente) projectado em termos de «marketing» editorial e livreiro. É para se vender – muito e depressa – que o best-seller Ă© construĂdo com os olhos postos num leitor-tipo que vai encontrar nele aquilo que exactamente esperava. Nem mais, nem menos. Os exemplos, abundantĂssimos, nem vale a pena enumerá-los. ConvĂ©m nĂŁo confundir, pelo menos em todos os casos, best-seller com «topes» de venda. Embora seja cabeça de lista, o best-seller tem, em relação aos livros «normais», uma caracterĂstica que logo o diferencia: foi feito propositadamente para ser um campeĂŁo de vendas. A sua razĂŁo de ser Ă© essa e sĂł essa. E aqui poderia dizer-se, recuperando o lugar-comum para um sentido sĂ©rio, que «o resto Ă© literatura».
Estou a pensar em bestas céleres como Love Story ou O Aeroporto. Não estou a pensar em «topes» de venda como O Nome da Rosa ou Memórias de Adriano. estes últimos são boa, excelente literatura que, por razões pontuais e,