Textos sobre Palavras

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Textos de palavras escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Apogeu do Cobarde

Havia num partido um homem, que era demasiado medroso e cobarde para, alguma vez, contradizer os seus camaradas: empregavam-no para todos os serviços, exigiam tudo dele, porque ele tinha mais medo da má opinião dos seus camaradas que da morte; era um lamentável espírito fraco. Eles reconheceram isso e fizeram dele, em virtude das circunstâncias mencionadas, um herói e, por fim, até um mártir. Embora o cobarde, interiormente, dissesse sempre não, com os lábios pronunciava sempre sim, mesmo já no cadafalso, ao morrer pelas ideias do seu partido: é que, ao lado dele, estava um dos seus velhos camaradas, que o tiranizava tanto pela palavra e o olhar, que ele sofreu a morte realmente da maneira mais decente e, desde então, é homenageado como mártir e grande personalidade.

Amar e Ser Livre ao mesmo Tempo

Tudo o que posso dizer é que estou louco por ti. Tentei escrever uma carta e não consegui. Estou constantemente a escrever-te… Na minha cabeça, e os dias passam, e eu imagino o que pensarás. Espero impacientemente por te ver. Falta tanto para terça-feira! E não só terça-feira… Imagino quando poderás ficar uma noite… Quando te poderei ter durante mais tempo… Atormenta-me ver-te só por algumas horas e, depois, ter de abdicar de ti. Quando te vejo, tudo o que queria dizer desaparece… O tempo é tão precioso e as palavras supérfluas… Mas fazes-me tão feliz… porque eu consigo falar contigo. Adoro o teu brilhantismo, as tuas preparações para o voo, as tuas pernas como um torno, o calor no meio das tuas pernas. Sim, Anais, quero desmascarar-te. Sou demasiado galante contigo. Quero olhar para ti longa e ardentemente, pegar no teu vestido, acariciar-te, examinar-te. Sabes que tenho olhado escassamente para ti? Ainda há demasiado sagrado agarrado a ti.

A tua carta… Ah, estas moscas! Fazes-me sorrir. E fazes-me adorar-te também. É verdade, não te dou o devido valor. É verdade. Mas eu nunca disse que não me dás o devido valor. Acho que deve haver um erro no teu inglês.

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Que Todos os Dias Sejam Dias de Amor

João Brandão pergunta, propõe e decreta:
Se há o Dia dos Namorados, por que não haver o Dia dos Amorosos, o Dia dos Amadores, o Dia dos Amantes? Com todo o fogo desta última palavra, que circula entre o carnal e o sublime?
E o Dia dos Amantes Exemplares e o Dia dos Amantes Platônicos, que também são exemplares à sua maneira, e dizem até que mais?
Por que não instituir, ó psicólogos, ó sociólogos, ó lojistas e publicitários, o Dia do Amor?
O Dia de Fazê-lo, o Dia de Agradecer-lhe, o de Meditá-lo em tudo que encerra de mistério e grandeza, o Dia de Amá-lo? Pois o Amor se desperdiça ou é incompreendido até por aqueles que amam e não sabem, pobrezinhos, como é essencial amar o Amor.
E mais o Dia do Amor Tranqüilo, tão raro e vestido de linho alvo, o Dia do Amor Violento, o Dia do Amor Que Não Ousava Dizer o Seu Nome Mas Agora Ousa, na arrebentação geral do século?
Amor Complicado pede o seu Dia, não para tornar-se pedestre, mas para requintar em sua complicação cheia de vôos fora do horário e da visibilidade. Amor à Primeira Vista,

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Vontade de Mudança

Se achas que a situação da tua vida é insatisfatória ou até mesmo intolerável, só te rendendo primeiro conseguirás quebrar o padrão de resistência inconsciente que perpetua essa situação. Render-se é perfeitamente compatível com tomar providências, com iniciar uma mudança ou alcançar metas. Mas no estado de rendição há uma energia totalmente diferente, uma qualidade diferente que corre no que fizeres. Ao renderes-te, ligas-te novamente com a energia da fonte do Ser e, se o que fizeres estiver infuso do Ser, tornar-se-á numa celebração rejubilante da energia da vida, que te levará mais profundamente para dentro do Agora. Através da não-resistência, a qualidade da tua consciência e, por conseguinte, a qualidade de tudo o que fizeres ou criares, será incomensuravelmente realçada. Os resultados tomarão então conta de si próprios e reflectirão essa qualidade. Poderíamos chamar-lhe “acção rendida”. Não é o trabalho tal como o conhecemos desde há milhares de anos. À medida que mais seres humanos forem despertando, a palavra trabalho desaparecerá do nosso vocabulário, e talvez se crie uma palavra nova em sua substituição.

É a qualidade da tua consciência desse momento que é o factor determinante do tipo de futuro que vivenciarás, pelo que render-te é a coisa mais importante que podes fazer para provocar uma mudança positiva.

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Ó Mãe

Ó mãe, regressa a mim. Embala-me no tempo em que os teus lábios rebentavam de ternura. Ó mãe, ó minha mãe, ó rio de água pura, correndo pelas veias. Pelo vento.

Ó mãe, que és mãe de Deus, que és mãe de mim e mãe de Antero e de Camões, e mãe de quem lhe faltam as palavras como se faltasse o ar. E são assim uma espécie de filhos de ninguém. Abre o teu ventre, mãe. Acorda. Vem parir-me. E vem sofrer a minha dor uma vez mais. Morrer de amor por mim. Vem impedir-me o medo. Ensinar-me a amar a luz dos animais.

Ó mãe, ó minha mãe. Ó pátria. Ó minha pena. Que me pariste, assim, temperamental. Mãe de Ulisses, de Guevara e mãe de Helena. E mãe da minha dor universal.

A Necessidade de Ser Insultado

Com que frequência caminhei no quarto de um lado para o outro, com o desejo inconsciente que alguém me insultasse ou proferisse alguma palavra que eu pudesse interpretar como um insulto, para que eu desabafasse a minha raiva em alguém.
É uma experiência muito simples que acontece quase diáriamente, e ainda para mais quando existe algum outro segredo, uma aflição no coração, para o qual se deseja dar uma expressão verbal mas que não se consegue.

A Ânsia de Protagonismo Social

Qual o sentido de tamanha azáfama neste mundo? Qual a finalidade da avareza e da ambição, da perseguição de riqueza, do poder e da proeminência? Satisfazer as necessidades da natureza? O salário do mais humilde trabalhador pode satisfazê-las. Quais serão então as vantagens desse grande objectivo da vida humana a que chamamos melhorar a nossa condição?
Ser observado, ser correspondido, ser notado com simpatia, complacência e aprovação, são tudo vantagens que podemos propor-nos retirar daí. O homem rico compraz-se na sua riqueza porque sente que ela faz recair as atenções do mundo sobre si. O homem pobre, pelo contrário, envergonha-se da sua pobreza. Sente que ela o coloca fora do horizonte dos seus semelhantes. Sentir que não somos notados representa necessariamente uma desilusão para os desejos mais candentes da natureza humana. O homem pobre sai e volta a entrar despercebido, e permanece na mesma obscuridade seja no meio de uma multidão seja no recato do seu covil. O homem de nível e distinção, pelo contrário, é visto por todo o mundo. Toda a gente anseia por vê-lo. As suas acções são objecto de atenções públicas. Raro será o gesto, rara a palavra que ele deixe escapar que passe despercebida.

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O testemunho mais válido não é expresso por palavras, mas é aquele que irradia uma luz que dificilmente alguém pode apagar.

Tudo é Divino

Há uma elasticidade cósmica, se assim lhe posso chamar, que é extremamente enganadora. Dá ao homem a ilusão temporária de que é capaz de mudar as coisas. Mas o homem acaba sempre por tornar a cair em si. É aí, na sua própria natureza, que pode e deve praticar-se a transmutação, e em nenhum outro lugar. E quando um homem percebe a que ponto é isto verdade, reconciliando-se com todas as aparências do mal, da fealdade, da mentira e da frustração; a partir de então, deixa de aplicar ao mundo a sua imagem pessoal de tristeza e dor, de pecado e corrupção.
Eu poderia, é certo, formular tudo isto de modo muito mais simples, dizendo que, aos olhos de Deus, tudo é divino. E quando digo tudo, é mesmo tudo o que quero dizer. Quando olhamos as coisas a tal luz, a palavra «transmutação» adquire um sentido ainda maior: pressupõe que o nosso bem-estar depende do nosso entendimento espiritual, do modo como nos servimos da visão divina que possuímos.

Arte Com ou Sem Nacionalidade

O que se deve entender por arte portuguesa? Concorda com este termo? Há arte verdadeiramente portuguesa?
— Por arte portuguesa deve entender-se uma arte de Portugal que nada tenha de português, por nem sequer imitar o estrangeiro. Ser português no sentido decente da palavra, é ser europeu sem a má-criação de nacionalidade. Arte portuguesa será aquela em que a Europa — entendendo por Europa principalmente a Grécia antiga e o universo inteiro — se mire e se reconheça sem se lembrar do espelho. Só duas nações — a Grécia passada e Portugal futuro — receberam dos deuses a concessão de serem não só elas mas também todas as outras. Chamo a sua atenção para o facto, mais importante que geográfico, de que Lisboa e Atenas estão quase na mesma latitude.

Todos os Homens Dão Mais Atenção às Palavras do que às Coisas

Todos os homens dão mais atenção às palavras do que às coisas; o que faz com que concordem muitas vezes com termos que não entendem e que não se preocupam em entender, ou porque acreditam tê-los entendido noutros tempos, ou porque lhes pareceu que aqueles que lhos ensinaram conheciam-lhe o significado e que eles o aprenderam pelo mesmo meio.

Virtude Representa Muito Mais que Bondade

Parece-me que a virtude é coisa diferente e mais nobre do que as inclinações para a bondade que nascem em nós. As almas bem ajustadas por si mesmas e bem nascidas seguem o mesmo andamento e apresentam nas suas ações a mesma aparência que as virtuosas. Porém a virtude significa não sei quê de maior e mais activo do que, por uma índole favorecida, deixar-se conduzir docemente e tranquilamente na esteira da razão. Aquele que com uma doçura e complacência naturais menosprezasse as ofensas recebidas faria coisa mui bela e digna de louvor; mas aquele que, espicaçado e ultrajado até o âmago por uma ofensa, se armasse com as armas da razão contra o furio­so apetite de vingança e após um grande conflito finalmen­te o dominasse, sem a menor dúvida seria muito mais. Aquele agiria bem, e este virtuosamente: uma acção poder-­se-ia dizer bondade; a outra, virtude, pois parece que o nome de virtude pressupõe dificuldade e oposição, e que ela não pode se exercer sem combate. Talvez seja por isso que chamamos Deus de bom, forte e liberal, e justo; mas não O chamamos de virtuoso: Os Seus actos são todos natu­rais e sem esforço.
Metelo, o único de todos os senadores romanos a se ter proposto,

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A Imperfeição dos Nossos Sentidos

Se os nossos sentidos fossem perfeitos, não precisávamos de inteligência; nem as ideias abstractas de nada nos serviriam. A imperfeição dos nossos sentidos faz com que não concordemos em absoluto sobre um objecto ou um facto do exterior. Nas ideias abstractas concordamos em absoluto.
Dois homens não vêem uma mesa da mesma maneira; mas ambos entendem a palavra «mesa» da mesma maneira. Só querendo visualizar uma coisa é que divergirão; isso, porém, não é a ideia abstracta da mesa.

Intragável é Estar Parado

Intragável é estar parado. Não mudar. Aguentar. Sobreviver. Permanecer. Mesmo que seja pouco, mesmo que seja insuficiente. Manter tudo como está apenas para não correr o risco de ficar pior. Intragável é não perdoar, não ilibar. E só criticar, só apontar, só atacar. E não criar, não refazer, não imaginar. Intragável é não acreditar. Intragável é o que não é maravilhoso, o que não é delicioso, o que não é fantástico, monumental, abençoado, miraculoso, espantoso. Intragável é acordar para o dia a recusar o dia, a não querer o dia, a não apetecer o dia, a não pensar nas mil e uma maneiras de o tornar inesquecível. Deixar estar. Não mexer, não querer a ferida se for através da ferida que se chega à cura. Ser cauteloso, prevenido. Intragável é o que não é exagerado, o que não é desproporcionado, o que não parece incomportável. Se não parece incomportável, é insuportável. Não quero. Não admito. Não me admito. Intragável é repetir. Hoje como réplica exacta de ontem e como réplica exacta de amanhã. As mesmas coisas, as mesmas palavras, os mesmos actos, os mesmos movimentos. Sempre igual. Sempre o mesmo. Intragável é continuar por continuar, andar por andar, viver por viver.

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A Melhor Máquina fica aquém do Homem mais Embrutecido

Pode-se de facto conceber que uma máquina seja feita de tal forma que profira palavras e até que profira algumas a respeito das acções corporais que provocarão alguma mudança nos seus órgãos; de tal forma que, se for tocada nalgum lugar, ela pergunte o que lhe querem dizer, se tocada noutro, ela grite que a estão a magoar e coisas semelhantes; mas não conseguirá organizá-las diversamente para corresponder ao sentido de tudo o que for dito na sua presença, como os homens mais embrutecidos podem fazer.

Eu Gosto da Paisagem

Eu gosto da paisagem. Mas amo-a duma maneira casta, comovida, sem poder macular a sua intimidade em descrições a vintém por palavra. Chego a uma terra e não resisto: tenho de me meter pelos campos fora, pelas serras, pelos montes, saber das culturas, beber o vinho e provar o pão. E quando anoitece volto, como agora, cheio do enigma que fez cada região do seu feitio, tal e qual como pôs nas costas do dromedário aquela incrível marreca, e no pescoço do leão aquela fantástica juba.

A Amizade Ideal

Nada é mais agradável à alma do que uma amizade terna e fiel. É bom encontrarmos corações atenciosos, aos quais podes confiar todos os teus segredos sem perigo, cujas consciências receias menos do que a tua, cujas palavras suavizam as tuas inquietações, cujos conselhos facilitam as tuas decisões, cuja alegria dissipa a tua tristeza, cuja simples aparição te deixa radiante! Tanto quanto for possível, devemos escolher aqueles que estão livres de afecções: de facto, os vícios rastejam, passam de pessoa para pessoa com a proximidade e qualquer contacto com eles pode ser prejudicial.
Tal como numa epidemia, devemos ter o cuidado de não nos aproximarmos das pessoas afectadas, porque correremos perigo só de respirarmos perto delas, também, em relação aos amigos, devemos ter o cuidado de escolher aqueles que estão menos corrompidos: a doença começa quando se misturam os homens saudáveis com os doentes. Não estou, com isto, a exigir-te que procures e sigas apenas o sábio: de facto, onde encontrarás um homem destes, que procuro há tanto tempo? Procura o menos mau, antes de procurares o óptimo.
(…) Evitemos, sobretudo, os temperamentos tristes, que se lamentam de tudo e não deixam escapar uma única ocasião de se queixarem.

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Cada Dia que Passa me Aproxima de Si

Bom! Recebo neste instante a sua carta escrita à luz de uma só vela – e tenho de retirar tudo, tudo, tudo o que escrevi! Pois acabou-se! Não retiro. A minha querida dizia no outro dia que devíamos mostrar um ao outro todos os estados de espírito em que tivéssemos estado. Mostro-lhe, assim, que estive hoje, ontem, antes de ontem num estado de impaciência por uma palavra sua, gemendo e queixando-me de «ne voir rien venir». E mostro-lhe assim o desejo de ter todos os dias, ou quase todos, um doce, adorado, apetecido e consolador «petit mot». (…) As pessoas que se estimam nunca deviam se apartar; a culpa tem-na a nossa complicada civilização; o encanto seria que os que se amam se juntassem em tribos, acampando aqui e além, com as suas afeições e a sua bilha de água, and «settling down to be happy, anywhere, under a tree».

Cada dia que passa, agora, me aproxima de si. (…) Eu também não realizo bem a situação. Ela não deixa de ser ligeiramente romântica. Separamo-nos amigos, reencontramo-nos noivos. Que profunda, grave, séria diferença! Enquanto a gente se escreve, num tom de alegre felicidade, gracejando por vezes, falando de sentimentos e dando «notícias do coração» –

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O Amor-Próprio como Fonte de Todos os Males

É preciso não confundir o amor-próprio e o amor de si mesmo, duas paixões muito diferentes pela sua natureza e pelos seus efeitos. O amor de si mesmo é um sentimento natural que leva todo o animal a velar pela sua própria conservação, e que, dirigido no homem pela razão e modificado pela piedade, produz a humanidade e a virtude. O amor-próprio é apenas um sentimento relativo, factício e nascido na sociedade, que leva cada indivíduo a fazer mais caso de si do que de qualquer outro, que inspira aos homens todos os males que se fazem mutuamente, e que é a verdadeira fonte da honra.
Bem entendido isso, repito que, no nosso estado primitivo, no verdadeiro estado de natureza, o amor-próprio não existe; porque, cada homem em particular olhando a si mesmo como o único espectador que o observa, como o único ser no universo que toma interesse por ele, como o único juiz do seu próprio mérito, não é possível que um sentimento que teve origem em comparações que ele não é capaz de fazer possa germinar na sua alma.
Pela mesma razão, esse homem não poderia ter ódio nem desejo de vingança, paixões que só podem nascer da opinião de alguma ofensa recebida.

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