Textos sobre Personalidade de Vergílio Ferreira

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Textos de personalidade de Vergílio Ferreira. Leia este e outros textos de Vergílio Ferreira em Poetris.

O Dom da Simpatia

Ter o dom da simpatia. É das coisas que mais se invejam. Tem, como tudo, a sua técnica, mas os efeitos são sempre problemáticos. Há o sujeito amável, como o distante, o inteligente como o mediano, o modesto ou o vaidoso, o convincente como o retraído, o irónico ou o sério e assim por diante, com todas as qualidades que se quiserem e o seu contrário. Num caso e noutro pode-se ser «simpático» ou «antipático», captarmos os favores dos outros ou a sua repulsa. Não é fácil determinar o que realmente decide de uma adesão. E se fosse simplesmente o ter-se «personalidade»? O assumir-se verticalmente aquilo que se é? Isso ao menos imporia uma deferência ou «respeito». Lembra-se uma frase de um antigo tragediógrafo latino (Ácio) – que nos odeiem desde que nos temam. Não é evidentemente o caso aqui. Mas é qualquer coisa de parecido: que se seja o que se for, desde que se assuma isso em responsabilidade. O resto são apenas formas de «simpatia», ou seja, do «sentir-se com». E de todas elas, a base delas – ou seja, a admiração. Porque se não tem simpatia se não houver seja o que for de admiração: tem-se apenas tolerância ou piedade.

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A Dificuldade de Estabelecer e Firmar Relações

A dificuldade de estabelecer e firmar relações. Há uma técnica para isso, conheço-a. Nunca pude meter-me nela. Ser «simpático». É realmente fácil: prestabilidade, autodomínio. Mas. Ser sociável exige um esforço enorme — físico. Quem se habituou, já se não cansa. Tudo se passa à superfície do esforço. Ter «personalidade»: não descer um milímetro no trato, mesmo quando por delicadeza se finge. Assumirmos a importância de nós sem o mostrar. Darmo-nos valor sem o exibir. Irresistivelmente, agacho-me. E logo: a pata dos outros em cima. Bem feito. Pois se me pus a jeito. E então reponto. O fim. Ser prestável, colaborar nas tarefas que os outros nos inventam. Colóquios, conferências, organizações de. Ah, ser-se um «inútil» (um «parasita»…). Razões profundas — um complexo duplo que vem da juventude: incompreensão do irmão corpo e da bolsa paterna. O segundo remediou-se. Tenho desprezo pelo dinheiro. Ligo tão pouco ao dinheiro que nem o gasto… Mas «gastar» faz parte da «personalidade». Saúde — mais difícil. Este ar apeuré que vem logo ao de cima. A única defesa, obviamente, é o resguardo, o isolamento, a medida.
É fácil ser «simpático», difícil é perseverar, assumir o artifício da facilidade. Conservar os amigos. «Não és capaz de dar nada»,

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A Solidão do Artista

Diz-se às vezes de certas pessoas, e para isso se reprovar, que têm dupla personalidade. Mas dupla ou múltipla têm-na normalmente os artistas. Ela é pelo menos a do convívio exterior e a do seu intimismo. Se trazem esta para a rua, são quase sempre insuportáveis. Só se suporta o que é de um profundo interesse, quando isso é rentável. Imagino que o capitalista tenha na sua vida íntima um mundo de cifrões. Se o cifrão vier à rua, tem ainda cotação. Mas o artista? Mesmo a coisa minúscula da sua pequena vaidade é irritante. Um político pode blasonar pimponice, que tem adeptos a aplaudir. O artista é um condenado, com o ferrete da ignomínia. O seu dever social é ocultar a degradação ou então marginalizar-se. Para efeitos cívicos ou mundanos, só depois de bem morto. A solidão é assim o seu destino. Aí sofre ou tem alegrias, aí obedece a um estranho mandato que lhe passaram na eternidade. Discreto, envergonhado, todo o seu esforço, no domínio das relações, é esconder a sua mancha. Nenhum povo existe senão pelo seu espírito. Somos o que somos pelo que foi excepção dos que nos precederam. Mas o dia a dia não é espiritual,

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