Ninguém me Ama a Ponto de Ser Eu
Fiz o que era mais urgente: uma prece. Rezo para achar o meu verdadeiro caminho. Mas descobri que nĂŁo me entrego totalmente Ă prece, parece-me que sei que o verdadeiro caminho Ă© com dor. Há uma lei secreta e para mim incompreensĂvel: sĂł atravĂ©s do sofrimento se encontra a felicidade. Tenho medo de mim pois sou sempre apta a poder sofrer. Se eu nĂŁo me amar estarei perdida — porque ninguĂ©m me ama a ponto de ser eu, de me ser. Tenho que me querer para dar alguma coisa a mim. Tenho que valer alguma coisa? Oh protegei-me de mim mesma, que me persigo. Valho qualquer coisa em relação aos outros — mas em relação a mim, sou nada. É tĂŁo bom ter a quem pedir. Nem me incomodo muito se eu nĂŁo for totalmente atendida. Eu peço a Deus para eu ser mais bonita — e nĂŁo Ă© que meu olho faĂsca ao mesmo tempo que meus lábios parecem mais doces e cheios? Eu peço a Deus tudo o que eu quero e preciso. É o que me cabe. Ser ou nĂŁo ser atendida — isso nĂŁo me cabe a mim, isto já Ă© matĂ©ria-mágica que se me dá ou se retrai.
Textos sobre Preces de Clarice Lispector
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