A Imagem Ă© Sempre Fruto da Vaidade
O aplauso Ă© o Ădolo da vaidade, por isso as acçÔes herĂłicas nĂŁo se fazem em segredo, e por meio delas procuramos que os homens formem de nĂłs o mesmo conceito, que nĂłs temos de nĂłs mesmos. Raras vezes somos generosos, sĂł pela generosidade, nem valerosos sĂł pelo valor. A vaidade nos propĂ”e, que o mundo todo se aplica em registar os nossos passos; para este mundo Ă© que obramos; por isso hĂĄ muita diferença de um homem, a ele mesmo: posto no retiro Ă© um homem comum, e muitas vezes ainda com menos talento que o comum dos homens; porĂ©m posto em parte donde o vejam, todo Ă© acção, movimento, esforço.
Nunca mostramos o que somos, senĂŁo quando entendemos que ninguĂ©m nos vĂȘ, e isto porque nĂŁo exercitamos as virtudes pela excelĂȘncia delas, mas pela honra do exercĂcio, nem deixamos de ser maus por aversĂŁo ao mal, mas pelo que se segue de o ser. O vĂcio pratica-se ocultamente, porque cremos que a ignomĂnia sĂł consiste em se saber; de sorte que se somos bons, Ă© por causa dos mais homens, e nĂŁo por nossa causa; haja quem nos assegure, que nĂŁo hĂĄ-de saber-se um desacerto, e logo nos tem certo,
Textos sobre Receio de Matias Aires
2 resultadosO Mal e o Bem em Função da Vaidade
Ă raro o mal, de que nĂŁo venha a nascer algum bem, nem bem, que nĂŁo produza algum mal: como sĂł o presente Ă© nosso, por isso nĂŁo nos serve de alĂvio o bem futuro, nem nos inquieta o mal que ainda nĂŁo sentimos; um infeliz nĂŁo se persuade, que a sua sorte possa ter mudança; um venturoso nĂŁo crĂȘ, que possa deixar de o ser; a este a vaidade tira o menor receio; Ă quele o abatimento priva de esperança. Se fizermos reflexĂŁo, havemos de admirar o pouco que basta para fazer o nosso bem, ou o nosso mal: de um instante a outro mudamos da alegria para a tristeza, e muitas vezes sem outro algum motivo, que o de uma vaidade mais, ou menos satisfeita.
Os homens nĂŁo sĂŁo todos igualmente sensĂveis ao bem, e ao mal; a uns penetra mais vivamente a dor, a outros sĂł faz uma impressĂŁo ligeira; o bem nĂŁo acha em todos o mesmo grau de contentamento. Nas almas deve de haver a mesma diferença, que hĂĄ nos corpos: umas mais dĂ©beis, e outras mais robustas; por isso em umas obra mais o sentimento, e acha mais resistĂȘncia em outras; em umas domina a vaidade com impĂ©rio,