Felicidade Aparente
Ao reflectir sobre a frescura das recordações, sobre a cor encantada de que elas se revestem num passado longĂnquo, nĂŁo pude deixar de admirar esse trabalho involuntário da alma que separa e suprime na recordação desses momentos agradáveis tudo o que poderia diminuir o encanto do momento entĂŁo vivido.
(…) Poderá uma pessoa afirmar ter sido feliz num determinado momento da sua vida, que lhe parece encantador retrospectivamente? O prĂłprio facto de o recordar ao dar-se conta da felicidade que entĂŁo deve ter sentido deve satisfazĂŞ-lo. Mas ter-se-ia sentido efectivamente feliz nesse instante de pretensa felicidade?
Pode-se compara essa pessoa com um indivĂduo que possuĂsse uma parcela de terra em que estivesse escondido um tesouro, do qual ele, contudo, nĂŁo teria conhecimento. Poder-se-Ă considerar «rico» esse homem? Do mesmo modo nĂŁo considero feliz aquele que o Ă© sem se aperceber disso, ou sem saber a que ponto monta a sua felicidade.
Textos sobre Saber de Eugène Delacroix
3 resultadosA Sabedoria do Homem Comum
Os ignorantes e o homem comum nĂŁo tĂŞm problemas. Para eles na Natureza tudo está como deve estar. Eles compreendem as coisas pela simples razĂŁo delas existirem. E, na realidade, nĂŁo dĂŁo eles provas de mais razĂŁo do que todos os sonhadores, que chegam a duvidar do seu prĂłprio pensamento? Morre um dos seus amigos, e como julgam saber o que Ă© a morte Ă dor que sentem por o perderem nĂŁo acrescentam a cruel ansiedade que resulta da impossibilidade de aceitar um acontecimento tĂŁo natural… Estava vivo, e agora encontra-se morto; falava-me, o seu espĂrito prestava atenção ao que eu lhe dizia, mas hoje já nada disso existe: resta apenas aquele tĂşmulo – mas repousa ele nesse tĂşmulo, tĂŁo frio como a prĂłpria sepultura? Erra a sua alma em redor desse monumento? Quando eu penso nele Ă© a sua alma que vem assolar a minha memĂłria? O hábito traz-nos de novo, contudo, ao nĂvel do homem comum.
Quando o seu rasto se tiver apagado – nĂŁo há dĂşvidas de que ele morreu! – entĂŁo a coisa deixará de nos incomodar. Os sábios e os pensadores parecem portanto menos avançados que o homem comum, já que eles prĂłprios nĂŁo tĂŞm a certeza,
O Ciclo da Vida
O homem domina a natureza e Ă© por ela dominado. SĂł ele lhe resiste e ao mesmo tempo ultrapassa as suas leis, amplia o seu poderio graças Ă sua vontade e actividade. Afirmar no entanto que o mundo foi criado para o homem Ă© algo que está longe de ser evidente. Tudo o que o homem constrĂłi Ă©, como ele, efĂ©mero: o tempo derruba os edifĂcios, atulha os canais, apaga o saber – e atĂ© o nome das nações. (…) Dir-me-ĂŁo que as novas gerações recebem a herança das gerações que as precederam e que, por consequĂŞncia, a perfeição ou o aperfeiçoamento nĂŁo tĂŞm limites. Mas o homem está longe de receber intacta a sĂşmula dos conhecimentos acumulados pelos sĂ©culos que o precederam e se aperfeiçoa algumas dessas invenções no que diz respeito a outras fica bastante atrás dos seus prĂłprios inventores; um grande nĂşmero dessas invenções chega mesmo a perder-se.
NĂŁo preciso sequer de sublinhar como certos pretensos melhoramentos foram nocivos Ă moral e ao bem-estar. Determinada invenção, suprimindo ou diminuindo o trabalho e o esforço, enfraqueceu a dose de paciĂŞncia necessária para suportar as contrariedades – ou a energia que temos de dar provas para as vencer.