Em Toda a Biblioteca há Espíritos
Penso que em toda a biblioteca há espíritos. Esses são os espíritos dos mortos que só despertam quando o leitor os busca. Assim, o acto estético não corresponde a um livro. Um livro é um cubo de papel, uma coisa entre coisas. O acto estético ocorre muito poucas vezes, e cada vez em situações inteiramente diferentes e sempre de modo preciso. (…) Detenhamo-nos nesta ideia: onde está a fé do leitor? Porque, para ler um livro, devemos acreditar nele? Se não acreditamos no livro, não acreditamos no prazer da leitura. (…) Acompanhamos a ficção como acontece, de alguma maneira, no sonho.
Textos sobre Sempre de Jorge Luis Borges
3 resultadosOs Clássicos da Literatura
As emoções que a literatura suscita são talvez eternas, mas os meios devem variar constantemente, mesmo que lligeiramente, para não perder a sua virtude. Desgastam-se à medida que o leitor os reconhece. Daí o perigo de afirmar que existem obras clássicas que o serão para sempre.
Cada qual descrê da sua arte e dos seus artifícios. Eu, que me resignei a pôr em dúvida a indefinida duração de Voltaire ou de Shakespeare, acredito (nesta tarde de um dos últimos dias de 1965) na de Schopenhauer e na de Berkeley.
Clássico não é um livro (repito-o) que possui necessariamente tais ou tais méritos. É um livro que as gerações dos homens, motivadas por razões diversas, lêem com prévio fervor e com uma misteriosa lealdade.
O Presente não Existe
Não é extraordinário pensar que dos três tempos em que dividimos o tempo – o passado, o presente e o futuro -, o mais difícil, o mais inapreensível, seja o presente? O presente é tão incompreensível como o ponto, pois, se o imaginarmos em extensão, não existe; temos que imaginar que o presente aparente viria a ser um pouco o passado e um pouco o futuro. Ou seja, sentimos a passagem do tempo. Quando me refiro à passagem do tempo, falo de uma coisa que todos nós sentimos. Se falo do presente, pelo contrário, estarei falando de uma entidade abstracta. O presente não é um dado imediato da consciência.
Sentimo-nos deslizar pelo tempo, isto é, podemos pensar que passamos do futuro para o passado, ou do passado para o futuro, mas não há um momento em que possamos dizer ao tempo: «Detém-te! És tão belo…!», como dizia Goethe. O presente não se detém. Não poderíamos imaginar um presente puro; seria nulo. O presente contém sempre uma partícula de passado e uma partícula de futuro, e parece que isso é necessário ao tempo.