O Amor na Lama

– Esteban, o homem nĂŁo poderia fazer grandes obras sem trabalhos pequenos; na maqueta do carpinteiro estĂĄ todo o edifĂ­cio do arquiteto, nĂŁo hĂĄ profissĂ”es grandes e pequenas: alegro-me que tenhas decidido ficar connosco na carpintaria, mas convĂ©m que te lembres disso. NĂŁo te esqueças de que Deus tambĂ©m se senta numa cadeira e come a uma mesa e dorme numa cama. Como qualquer um. Pode prescindir dos retĂĄbulos, das estĂĄtuas e dos livros que lhe dedicam, incluindo a BĂ­blia, mas nĂŁo da cadeira, da mesa e da cama. — O meu tio esforçava-se muito. Queria que eu me sentisse bem na profissĂŁo. Que começasse a gostar dela. Acreditava que eu vivia como um fracasso a decisĂŁo de ter abandonado a Escola de Belas–Artes. IntuĂ­a certamente que eu precisava de desenvolver a minha autoestima. Mas tudo isso me parecia mera retĂłrica — e era-o —, a verdade Ă© que por essa altura jĂĄ tinha começado a sair com Leonor e era ela quem eu amava, aprendia a gostar de mim atravĂ©s dela. Descobria o meu corpo em cada palmo do corpo dela, e o meu corpo ganhava valor porque lhe pertencia, era o seu complemento: acreditava que partilhĂĄvamos dois corpos que jamais poderiam separar-se e viver cada um por si.

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