Passagens sobre Tristeza

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Frases sobre tristeza, poemas sobre tristeza e outras passagens sobre tristeza para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Dobrada à Moda do Porto

Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.

Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.

Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo …

(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).

Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio, mas veio frio.

O senhor não esteve lá. O senhor não escutou, em cada anoitecer, a lugugem do canto da mãe-da-lua. O senhor não pode estabelecer em sua ideia a minha tristeza quinhoã. Até os pássaros, consoante os lugares, vão sendo muito diferentes. Ou são os tempos, travessia da gente?

Nada Vence as Paixões Profundas de Cada Um

As paixões opõem-se às paixões, e podem servir de contrapeso umas às outras; mas a paixão dominante não se pode conduzir senão pelo seu próprio interesse, real ou imaginário, porque ela reina despoticamente sobre a vontade, sem a qual nada se pode. Contemplo humanamente as coisas, e acrescento nes­se espírito: nem todo o alimento é próprio para todos os cor­pos; nem todos os objetos são suficientes para tocar deter­minadas almas. Quem acredita serem os homens árbitros soberanos dos seus sentimentos não conhece a natureza; consiga-se que um surdo se divirta com os sons encantado­res de Mureti, peça-se a uma jogadora, que está a jogar uma grande partida, que tenha a complacência e a sabedo­ria de se enfadar durante a mesma, nenhuma arte pode fazê-lo.
Os sábios enganam-se quando oferecem a paz às paixões: as paixões são inimigas dela. Eles elogiam a mo­deração para aqueles que nasceram para a acção e para uma vida agitada; que importa a um homem doente a delicadeza de um festim que lhe repugna? Nós não conhecemos os defeitos de nossa alma; mas ainda que pudéssemos conhecê-los, raramente havería­mos de os querer vencer.
As nossas paixões não são distintas de nós mesmos; al­gumas delas são todo o fundamento e toda a substância da nossa alma.

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Os Captivos

Encostados ás grades da prisão,
Olham o céo os palidos captivos.
Já com raios obliquos, fugitivos,
Despede o sol um ultimo clarão.

Entre sombras, no longe, vagamente,
Morrem as vozes na extensão saudosa.
Cae do espaço, pesada, silenciosa,
A tristeza das cousas, lentamente.

E os captivos suspiram. Bandos de aves
Passam velozes, passam apressados,
Como absortos em intimos cuidados,
Como absortos em pensamentos graves.

E dizem os captivos: Na amplidão
Jamais se extingue a eterna claridade…
A ave tem o vôo e a liberdade…
O homem tem os muros da prisão!

Aonde ides? qual é vossa jornada?
Á luz? á aurora? á immensidade? aonde?
— Porém o bando passa e mal responde:
Á noite, á escuridão, ao abysmo, ao nada! —

E os captivos suspiram. Surge o vento,
Surge e perpassa esquivo e inquieto,
Como quem traz algum pezar secreto,
Como quem soffre e cala algum tormento.

E dizem os captivos: Que tristezas,
Que segredos antigos, que desditas,
Caminheiro de estradas infinitas,
Te levam a gemer pelas devezas?

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Soneto XV

Triste do que em tristeza passa o dia,
Feliz porém, se a passa, e enfim lhe passa,
Mas quem ventura teve tão escassa
Que em nada ache prazer nem alegria.

Nos ais, alívio tem quem n’alma os cria,
A quem em trevas vive, a luz dá graça,
Há quem do fogo e Sol se satisfaça,
E quem se satisfaça d’água fria.

Restaura o ar, na calma, o fraco alento,
Conforta o cheiro de ua flor suave,
Convida a sombra, a erva a grato assento,

Suspende da Ave o canto a pena grave;
Ai que não aliviam meu termento
Ais, luz, Sol, fogo, água, ar, flor, sombra, erva, Ave.

Deus Triste

Deus é triste.

Domingo descobri que Deus é triste
pela semana afora e além do tempo.

A solidão de Deus é incomparável.
Deus não está diante de Deus.
Está sempre em si mesmo e cobre tudo
tristinfinitamente.

A tristeza de Deus é como Deus: eterna.

Deus criou triste.
Outra fonte não tem a tristeza do homem.

Não estou bem certo da distância que vai do coração à consciência, e menos ainda se é possível envergonhar-se esta do que faz aquele. Ao primeiro intuito, consciência, coração e espírito afiguram-se-me entidades que operam unidas, elevam-se unidas, despenham-se unidas, e interessam-se nos júbilos da virtude, ou nas tristezas do remorso.

É preciso buscar o amor onde estiver, mesmo que isso signifique horas, dias, semanas de decepção e tristeza. Porque ao momento em que partimos em busca do amor, ele também parte ao nosso encontro.

Vai a Fresca Manhã Alvorecendo

Vai a fresca manhã alvorecendo,
vão os bosques as aves acordando,
vai-se o Sol mansamente levantando
e o mundo à vista dele renascendo.

Veio a noite os objectos desfazendo
e nas sombras foi todos sepultando;
eu, desperta, o meu fado lamentando.
fui coa ausência da luz esmorecendo.

Neste espaço, em que dorme a Natureza.
porque vigio assim tão cruelmente?
Porque me abafa ó peso da tristeza?

Ah, que as mágoas que sofre o descontente,
as mais delas são faltas de firmeza.
Torna a alentar-te, ó Sol resplandecente!

Eterna Mágoa

O homem por sobre quem caiu a praga
Da tristeza do Mundo, o homem que é triste
Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!

Não crê em nada, pois, nada há que traga
Consolo à Mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.

Sabe que sofre, mas o que não sabe
E que essa mágoa infinda assim não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infinda

Transpõe a vida do seu corpo inerme;
E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!

Símios Aperfeiçoados

É preciso viver em estado de prevenção. Não ir na enxurrada do colectivismo e morrer afogado num bairro económico ou numa colónia balnear, resistir às pressões políticas mirabolantes, quer sejam de uma banda ou de outra, manter a condição do homem-artista em luta com o homem-massa foi sempre o que em mim se tornou claro desde que aos poucos tomei posse da minha personalidade. É fatal que se caminhe para a sanidade de vida das classes baixas, é humano que isso se faça, no entanto também é humano, mais talvez, que se lute desesperadamente para que a condição mais sagrada do homem evolua libertando-se das massas satisfeitas com a assistência médica, televisão e funeral pago. Essa massa vai criar um novo espírito animal, vai catalogar-se em Darwin e, convencidos que essa massa está feliz, constatamos ao fim de pouco tempo que esses grandes grupos de populações standardizadas deixaram de pensar e o seu sentir é apenas tactual, sem nada de sublimação em momentos mais íntimos.
O mundo que pensa, do artista e do intelectual, tem de libertar-se do incómodo desses homens que trouxeram como contribuição para a humanidade uma ideia abstracta do colectivo em marcha, que passaram a emitir sons,

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Semântica Electrónica

Ordeno ao ordenador que me ordene o ordenado
Ordeno ao ordenador que me ordenhe o ordenhado
Ordinalmente
Ordenadamente
Ordeiramente.
Mas o desordeiro
Quebrou o ordenador
E eu já não dou ordens
coordenadas
Seja a quem for.
Então resolvo tomar ordens
Menores, maiores,
E sou ordenado,
Enfim – o ordenado
Que tentei ordenhar ao ordenador quebrado.
– Mas – diz-me a ordenança –
Você não pode ordenhar uma máquina:
Uma máquina é que pode ordenhar uma vaca.
De mais a mais, você agora é padre,
E fica mal a um padre ordenhar, mesmo uma ovelha
Velhaca, mesmo uma ovelha velha,
Quanto mais uma vaca!
Pois uma máquina é vicária (você é vigário?):
Vaca (em vacância) à vaca.
São ordens…
Eu então, ordinalmente ordeiro, ordenado, ordenhado,
Às ordens da ordenança em ordem unida e dispersa
(Para acabar a conversa
Como aprendi na Infantaria),
Ordenhado chorei meu triste fado.
Mas tristeza ordenhada é nata de alegria:
E chorei leite condensado,
Leite em pó, leite céptico asséptico,
Oh, milagre ordinal de um mundo cibernético!

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Réquiem Do Sol

Águia triste do Tédio, sol cansado,
Velho guerreiro das batalhas fortes!
Das ilusões as trêmulas coortes
Buscam a luz do teu clarão magoado…

A tremenda avalanche do Passado
Que arrebatou tantos milhões de mortes
Passa em tropel de trágicos Mavortes
Sobre o teu coração ensangüentado…

Do alto dominas vastidões supremas
Águia do Tédio presa nas algemas
Da Legenda imortal que tudo engelha…

Mas lá, na Eternidade, de onde habitas,
Vagam finas tristezas infinitas,
Todo o mistério da beleza velha!

Eu joguei a bola no meio da argola. Eu joguei a beleza no meio da tristeza. Eu joguei o tempero no meio do desespero. Eu tirei o calor e troquei pelo amor!