Passagens sobre Trovões

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Frases sobre trovões, poemas sobre trovões e outras passagens sobre trovões para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Estar Sozinho

Tornei-me um homem da multidão. Nunca confiei em mim próprio o bastante para estar sozinho. Dia e noite caminhava lestamente através das multidões, acotovelando, agarrando-me ansioso a quem pudesse. Muitos pensavam que eu era ladrão. Mas comprimia o meu corpo contra o corpo dos outros como uma criança se agarra à mãe durante uma tempestade. Procurava tapar os olhos à minha consciência como uma criança procura não avistar o relâmpago; esforçava-me por tapar os meus ouvidos mentais, como uma criança procura esconder-se no regaço da mãe para não ouvir o som dos trovões. E se houvesse uma clareira nessa multidão, apressava-me, corria, os braços esticados, ansioso pelo toque do corpo de alguém, o meu próprio corpo ansioso pelo contacto fugaz. E sempre, sempre, entre a confusão e o ruído das passadas, tremia a ouvir esses passos constantes, inexoráveis.

NĂŁo Passo um Dia sem te Desejar

NĂŁo passo um dia sem te desejar, nem uma noite sem te apertar nos meus braços; nĂŁo tomo uma chávena de chá sem amaldiçoar a glĂłria e a ambição que me mantĂŞm afastado da vida da minha vida. No meio das mais sĂ©rias tarefas, enquanto percorro o campo Ă  frente das tropas, sĂł a minha adorada Josefina me ocupa o espĂ­rito e o coração, absorvendo-me por completo o pensamento. Se me afasto de ti com a rapidez da torrente do RĂłdano, Ă© para tornar a ver-te o mais cedo possĂ­vel. Se me levanto a meio da noite para trabalhar, Ă© no intuito de abreviar a tua vinda. (…) Adeus, mulher, tormento, felicidade, esperança da minha vida, que eu amo, que eu temo, que me inspira os sentimentos mais ternos e naturais, tanto como me provoca Ă­mpetos mais vulcânicos do que o trovĂŁo. NĂŁo te peço amor eterno nem fidelidade, apenas verdade e uma franqueza sem limites. No dia em que disseres: «quero-te menos», será o Ăşltimo dia do amor. Se o meu coração atingisse a baixeza de poder continuar a amar sem ser amado, trincá-lo-ia com os dentes. Josefina. Lembra-te do que te disse algumas vezes: a natureza fez-me a alma forte e decidida.

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Um CĂ©u e Nada Mais

Um céu e nada mais — que só um temos,
como neste sistema: sĂł um sol.
Mas luzes a fingir, dependuradas
em abóbada azul — como de tecto.
E o seu nĂşmero tal, que deslumbrados
neram os teus olhos, se tas mostrasse,
amor, tĂŁo de ribalta azul, como de
circo, e dança então comigo no
trapézio, poema em alto risco,
e um levíssimo toque de mistério.
Pega nas lantejoulas a fingir
de sóis mal descobertos e lança
agora a âncora maior sobre o meu
coração. Que não te assuste o som
desse trovĂŁo que ainda agora ouviste,
era de deus a sua voz, ou mito,
era de um anjo por demais caĂ­do.
Mas, de verdade: natural fenĂłmeno
a invadir-te as veias e o cérebro,
tão frágil como álcool, tão de
potente e liso como álcool
implodindo do céu e das estrelas,
imensas a fingir e penduradas
sobre abĂłbada azul. Se te mostrasse,
amor, a cor do pesadelo que por
aqui passou agora mesmo, um céu
e nada mais — que nada temos,
que nĂŁo seja esta angĂşstia de
mortais (e a maldição da rima,

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Majestade CaĂ­da

Esse cornĂłide deus funambulesco
Em torno ao qual as Potestades rugem,
Lembra os trovões, que tétricos estrugem,
No riso alvar de truĂŁo carnavalesco.

De ironias o momo picaresco
Abre-lhe a boca e uns dentes de ferrugem,
Verdes gengivas de ácida salsugem
Mostra e parece um Sátiro dantesco.

Mas ninguém nota as cóleras horríveis,
Os chascos, os sarcasmos impassĂ­veis
Dessa estranha e tremenda Majestade.

Do torvo deus hediondo, atroz, nefando,
Senil, que embora, rindo, está chorando
Os Noivados em flor da Mocidade!

O DilĂşvio

Há muitos dias já, há já bem longas noites
que o estalar dos vulcões e o atroar das torrentes
ribombam com furor, quais rábidos açoites,
ao crebro rutilar dos coriscos ardentes.

Pradarias, vergéis, hortos, vinhedos, matos,
tudo desapar’ceu ao rude desabar
das constantes, hostis, raivosas cataratas,
que fizeram da Terra um grande e torvo mar.

Ă€ flor do torvo mar, verde como as gangrenas,
onde homens e leões bóiam agonizantes,
imprecando com fĂşria e angĂşstia, erguem-se apenas,
quais monstros colossais, as montanhas gigantes.

É aí que, ululando, os homens como as feras
refugiar-se vão em trágicos cardumes,
O mar sobe, o mar cresce. e os homens e as panteras,
crianças e reptis caminham para os cumes.

Os fortes, sem haver piedade que os sujeite,
arremessam ao chĂŁo pobres velhos cansados.
e as mães largam. cruéis, os filhinhos de leite,
que os que seguem depois pisam, alucinados.

Um sinistro pavor; crescente e sufocante,
desnorteia, asfixia a turba pertinaz:
ouvem-se urros de dor, e os que vĂŁo adiante
lançam pedras brutais aos que ficam pra trás.

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O Tempo Gastador de Mil Idades

O Tempo gastador de mil idades,
Que na décima esfera vive e mora,
NĂŁo descansa co’a FĂşria tragadora,
De exercitar, feroz, suas crueldades.

Ele destrĂłi as Ă­nclitas cidades,
As egípcias pirâmides devora:
Sua dentada fouce assoladora,
Rompe forças viris, destrói beldades.

O bronze, o ouro, o rĂ­gido diamante,
A sua mĂŁo pesada amolga e gasta
Levando tudo ao nada, em giro errante.

Como trovĂŁo feroz rugindo arrasta,
Quanto cobre na Terra o sol radiante,
SĂł da Virtude com temor se afasta.

O Ă“dio liga mais os IndivĂ­duos que a Amizade

O Ăłdio, a inveja e o desejo de vingança ligam muitas vezes mais dois indivĂ­duos um ao outro do que o podem fazer o amor e a amizade. Pois está em causa a comunidade de interesses interiores ou exteriores e a alegria que se sente nessa comunidade – onde Ă© muitas vezes determinada a essĂŞncia das relações positivas entre os indivĂ­duos: o amor e a amizade – Ă© sempre relativa e nĂŁo Ă© em nenhum caso um estado de alma permanente; mas as relações negativas, essas sĂŁo, a maior parte das vezes, absolutas e constantes. O Ăłdio, a inveja e o desejo de vingança tĂŞm, poder-se-ia dizer, o sono mais ligeiro do que o amor. O menor sopro os desperta, enquanto que o amor e a amizade continuam tranquilamente a dormir, mesmo sob o trovĂŁo e os relâmpagos.

O Divino

Nobre seja o homem,
Caridoso e bom!
Pois isso apenas
É que o distingue
De todos os seres
Que conhecemos.

GlĂłria aos incĂłgnitos
Mais altos seres
Que pressentimos!
Que o homem se lhes iguale!
Seu exemplo nos ensine
A crer naqueles!

Pois insensĂ­vel
É a natureza:
O sol ‘spalha luz
Sobre maus e bons,
E ao criminoso
Brilham como ao santo
A lua e as ‘strelas.

Vento e torrentes,
TrovĂŁo e saraiva
Rugem seu caminho
E agarram,
Velozes passando,
Um apĂłs outro.

Tal a sorte Ă s cegas
Lança mãos à turba
E agarra os cabelos
Do menino inocente
Ou a fronte calva
Do velho culpado.

Por eternas leis,
Grandes e de bronze,
Temos todos nĂłs
De fechar os cĂ­rculos
Da nossa existĂŞncia.

Mas somente o homem
Pode o impossĂ­vel:
SĂł ele distingue,
Escolhe e julga;
E pode ao instante
Dar duração.

SĂł ele Ă© que pode
Premiar o bom,
Castigar o mau,

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Poema do homem-rĂŁ

Sou feliz por ter nascido
no tempo dos homens-rĂŁs
que descem ao mar perdido
na doçura das manhãs.
Mergulham, imponderáveis,
por entre as águas tranquilas,
enquanto singram, em filas,
peixinhos de cores amáveis.
VĂŁo e vĂŞm, serpenteiam,
em compassos de ballet.
Seus lentos gestos penteiam
madeixas que ninguém vê.

Com barbatanas calçadas
e pulmões a tiracolo,
roçam-se os homens no solo
sob um céu de águas paradas.

Sob o luminoso feixe
correm de um lado para outro,
montam no lombo de um peixe
como no dorso de um potro.

Onde as sereias de espuma?
Tritões escorrendo babugem?
E os monstros cor de ferrugem
rolando trovões na bruma?

Eu sou o homem. O Homem.
Desço ao mar e subo ao céu.
Não há temores que me domem
É tudo meu, tudo meu.

Teu grito de guerra
Retumbe aos ouvidos
D’imigos transidos
Por vil comoção;
E tremam d’ouvi-lo
Pior que o sibilo
Das setas ligeiras,
Pior que o trovĂŁo.

Na ConfusĂŁo Do Mais Horrendo Dia

Na confusĂŁo do mais horrendo dia,
Painel da noite em tempestade brava,
O fogo com o ar se embaraçava
Da terra e água o ser se confundia.

Bramava o mar, o vento embravecia
Em noite o dia enfim se equivocava,
E com estrondo horrĂ­vel, que assombrava,
A terra se abalava e estremecia.

Lá desde o alto aos côncavos rochedos,
Cá desde o centro aos altos obeliscos
Houve temor nas nuvens, e penedos.

Pois dava o Céu ameaçando riscos
Com assombros, com pasmos, e com medos
Relâmpagos, trovões, raios, coriscos

A Esperança da Humanidade

A vida política, porém, veio como um trovão desviar-me dos meus trabalhos. Regressei uma vez mais à multidão.
A multidão humana foi a maior lição da minha vida. Posso chegar a ela com a inerente timidez do poeta, com o receio do tímido; mas, uma vez no seu seio, sinto-me transfigurado. Sou parte da essencial maioria, sou mais uma folha da grande árvore humana.

Solidão e multidão continuarão a ser deveres elementares do poeta do nosso tempo. Na solidão, a minha vida enriqueceu-se com a batalha da ondulação no litoral chileno. Intrigaram-me e apaixonaram-me as águas combatentes e os penhascos combatidos, a multiplicação da vida oceânica, a impecável formação dos «pássaros errantes», o esplendor da espuma marítima.

Mas aprendi muito mais com a grande maré das vidas, com a ternura vista em milhares de olhos que me viam ao mesmo tempo. Pode esta mensagem não ser possível a todos os poetas, mas quem a tenha sentido guardá-la-á no coração, desenvolvendo-a na sua obra.
É memorável e desvanecedor para o poeta ter encarnado para muitos homens, durante um minuto, a esperança.

Ermida

Lá onde a calma e a placidez existe,
Sobre as colinas que o vergel encobre,
Aquela ermida como está tão pobre,
Aquela ermida como está tão triste.

A minha musa, sem falar, assiste,
Do meio-dia ante o aspecto nobre,
O vago, estranho e murmurante dobre
Daquela ermida que aos trovões resiste

E as gargalhadas funéreas, sombrias,
Dos crus invernos e das ventanias,
Do temporal desolador e forte.

Daquela triste esbranquiçada ermida,
Que me recorda, me parece a vida
Jogada às magoas e ilusões da sorte.

Aos Mesmos

De insĂ­pida sessĂŁo no inĂştil dia
Juntou-se do Parnaso a galegage;
Em frase hirsuta, em gĂłtica linguage,
Belmiro um ditirambo principia.

Taful que o portuguĂŞs nĂŁo lhe entendia,
Nem ao resto da cĂ´mica salsage,
Saca o soneto que lhe fez Bocage,
E conheceu-se nele a Academia.

Dos sĂłcios o pior silvou qual cobra,
Desatou-se em trovões, desfez-se em raios,
Dando ao triste Bocage o que lhe sobra.

Fez na calúnia vil cruéis ensaios,
E jaz com grandes créditos a obra
Entre mĂŁos de marujos e lacaios.

Seja rápido como um trovão que retumba antes que se tenha podido tapar os ouvidos e veloz como o relâmpago que brilha antes de ter podido piscar.

O Coração – II

A solidĂŁo Ă© perfeita como um rasgo entre
as nuvens, ao Ăşltimo sonho. A solidĂŁo
que se cala em teu fundo e vai envelhecendo
na terra perdida do som descompassado.

Te guardas na intimidade dos armários,
onde a paz Ă© negra e se desagrega a luz.
Nunca foste mais do que uma ficção, matriz
de riso e sombra, um poço verde, teorema

de ilusões, engrenagem de poentes roxos.
E, agora, frouxo, já nada designas ou
desenhas. És, apenas, testemunha efémera

e longĂ­nqua, trovĂŁo engolido de Deus,
fingidor ferido de doces cantos, mentira
precária nas cordas de uma harpa febril.

Deus, Infinito Ser

Deus, Infinito ser, nunca criado,
Sem princĂ­pio, nem fim, na Majestade
Que no trono da Eterna Divindade
Tens o Mundo num dedo dependurado:

Tu estavas em Ti, nĂŁo foste nado,
O teu Ser era a tua Imensidade,
Tu tiveste por berço a Eternidade,
Tu, sem tempo, em Ti mesmo eras gerado!

Tu és um fogo que arde sem matéria,
Tu és perpétua luz, que não desmaia
Fulgindo, sem cessar, na sala etérea!

Tu Ă©s um mar de amor, que nĂŁo tem praia,
Trovão assustador da esfera aérea,
Rei dum Reino Imortal, que nĂŁo tem raia!…

Não é preciso ter olhos abertos para ver o sol, nem é preciso ter ouvidos afiados para ouvir o trovão. Para ser vitorioso você precisa ver o que não está visível.

Sátira

Besta e mais besta! O positivo Ă© nada…
(Perdoa, se em gramática te falo,
Arte que ignoras, como ignoras tudo.)
Besta e mais besta! Na palavra embirro;
Que a besta anexa ao mais teu ser define.

Dás-me louvor servil na voz do prelo,
Grande me crĂŞs, proclamas-me famoso,
Excelso, transcendente, incomparável,
Confessas que d’Elmano a fĂşria temes…
E, débil estorninho, águias provocas,
Aves de Jove, que o corisco empunham!

És de rábula vil corrupta imagem;
Tu vendes o louvor, como ele as partes,
Mas ele na enxovia infâmias paga,
E tu, com tĂşstios, que aos caloiros pilhas,
Compras gravatas, em que a tromba enorme
Sumas ao dia, que de a ver se embrusca,
Qual em tenra mĂŁozinha esconde a face
Mimoso infante de papões vexado.
Útil descuido aos cárceres te furta,
À digna habitação de ti saudosa
(Digo, o Castelo), estância equivalente
Aos méritos morais, que em ti reluzem.

De saloios vinténs larápio sujo,
A glĂłria do teu Ăłdio restitui
A quem no teu louvor desacreditas.
Se honrada pelos sábios d’Ulisseia
(D’Ulisseia nĂŁo sĂł,

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