Passagens sobre Vagas

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Frases sobre vagas, poemas sobre vagas e outras passagens sobre vagas para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Tarde no Mar

A tarde é de oiro rútilo: esbraseia
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,

Poisa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue ao seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia.
Desenha mãos sangrentas de assassino!

Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar…

E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes…

Não Julgues

Não julgues. A vida é um mistério, cada um obedece a leis diferentes. Conheces porventura a força das coisas que os conduziram, os sofrimentos e os desejos que cavaram o seu caminho? Supreendestes porventura a voz da sua consciência a revelar-lhes em voz baixa o segredo do seu destino? Não julgues; olha o lago puro e a água tranquila onde vêm quebrar-se as mil vagas que varrem o universo… É preciso que aconteça tudo aquilo que vês.
Todas as ondas do oceano são precisas para levar ao porto o navio da verdade. Acredita na eficácia da morte do que queres para participares do triunfo do que deve ser.

Lua Nova

Mãe dos frutos, Jaci, no alto espaço
Ei-la assoma serena e indecisa:
Sopro é dela esta lânguida brisa
Que sussurra na terra e no mar.
Não se mira nas águas do rio,
Nem as ervas do campo branqueia;
Vaga e incerta ela vem, como a idéia
Que inda apenas começa a espontar.

E iam todos; guerreiros, donzelas,
Velhos, moços, as redes deixavam;
Rudes gritos na aldeia soavam,
Vivos olhos fugiam p’ra o céu:
Iam vê-la, Jaci, mãe dos frutos,
Que, entre um grupo de brancas estrelas,
Mal cintila: nem pôde vencê-las,
Que inda o rosto lhe cobre amplo véu.

***

E um guerreiro: “Jaci, doce amada,
Retempera-me as forças; não veja
Olho adverso, na dura peleja,
Este braço já frouxo cair.
Vibre a seta, que ao longe derruba
Tajaçu, que roncando caminha;
Nem lhe escape serpente daninha,
Nem lhe fuja pesado tapir.”

***

E uma virgem: “Jaci, doce amada,
Dobra os galhos, carrega esses ramos
Do arvoredo co’as frutas* que damos
Aos valentes guerreiros, que eu vou
A buscá-los na mata sombria,

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Paira No Ambíguo Destinar-Se

Paira no ambíguo destinar-se
Entre longínquos precipícios,
A ânsia de dar-se preste a dar-se
Na sombra vaga entre suplícios,

Roda dolente do parar-se
Para, velados sacrifícios,
Não ter terraços sobre errar-se
Nem ilusões com interstícios,

Tudo velado, e o ócio a ter-se
De leque em leque, a aragem fina
Com consciência de perder-se…

Tamanha a flama e pequenina
Pensar na mágoa japonesa
Que ilude as sirtes da Certeza.

Quando Será?!

Quando será que tantas almas duras
Em tudo, já libertas, já lavadas
nas águas imortais, iluminadas
Do sol do Amor, hão de ficar bem puras?

Quando será que as límpidas frescuras
Dos claros rios de ondas estreladas
Dos céus do Bem, hão de deixar clareadas
Almas vis, almas vãs, almas escuras?

Quando será que toda a vasta Esfera,
Toda esta constelada e azul Quimera,
Todo este firmamento estranho e mudo,

Tudo que nos abraça e nos esmaga,
quando será que uma resposta vaga,
Mas tremenda, hão de dar de tudo, tudo?!

Dorme Enquanto Eu Velo…

Dorme enquanto eu velo…
Deixa-me sonhar…
Nada em mim é risonho.
Quero-te para sonho,
Não para te amar.

A tua carne calma
É fria em meu querer.
Os meus desejos são cansaços.
Nem quero ter nos braços
Meu sonho do teu ser.

Dorme, dorme, dorme,
Vaga em teu sorrir…
Sonho-te tão atento
Que o sonho é encantamento
E eu sonho sem sentir.

Não há Vagas

O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras

– porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira

Durmo ou não? Passam juntas em minha alma

Durmo ou não? Passam juntas em minha alma
Coisas da alma e da vida em confusão,
Nesta mistura atribulada e calma
Em que não sei se durmo ou não.

Sou dois seres e duas consciências
Como dois homens indo braço-dado.
Sonolento revolvo omnisciências,
Turbulentamente estagnado.

Mas, lento, vago, emerjo de meu dois.
Disperto. Enfim: sou um, na realidade.
Espreguiço-me. Estou bem… Porquê depois,
De quê, esta vaga saudade?

Tarde De Música

Só Schumann, meu Amor! Serenidade…
Não assustes os sonhos…Ah! não varras
As quimeras…Amor, senão esbarras
Na minha vaga imaterialidade…

Liszt, agora o brilhante; o piano arde…
Beijos alados…ecos de fanfarras…
Pétalas dos teus dedos feitos garras…
Como cai em pó de oiro o ar da tarde!

Eu olhava para ti…”é lindo! Ideal!”
Gemeram nossas vozes confundidas.
— Havia rosas cor-de-rosa aos molhos —

Falavas de Liszt e eu…da musical
Harmonia das pálpebras descidas,
Do ritmo dos teus cílios sobre os olhos…

Meridional

Cabelos

Ó vagas de cabelo esparsas longamente,
Que sois o vasto espelho onde eu me vou mirar,
E tendes o cristal dum lago refulgente
E a rude escuridão dum largo e negro mar;

Cabelos torrenciais daquela que me enleva,
Deixai-me mergulhar as mãos e os braços nus
No báratro febril da vossa grande treva,
Que tem cintilações e meigos céus de luz.

Deixai-me navegar, morosamente, a remos,
Quando ele estiver brando e livre de tufões,
E, ao plácido luar, ó vagas, marulhemos
E enchamos de harmonia as amplas solidões.

Deixai-me naufragar no cimo dos cachopos
Ocultos nesse abismo ebânico e tão bom
Como um licor renano a fermentar nos copos,
Abismo que se espraia em rendas de Alençon!

E, ó mágica mulher, ó minha Inigualável,
Que tens o imenso bem de ter cabelos tais,
E os pisas desdenhosa, altiva, imperturbável,
Entre o rumor banal dos hinos triunfais;

Consente que eu aspire esse perfume raro,
Que exalas da cabeça erguida com fulgor,
Perfume que estonteia um milionário avaro
E faz morrer de febre um louco sonhador.

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N. H.

Tu não és de Romeu a doce amante,
A triste Julieta, que suspira,
Solto o cabelo aos ventos ondeante,
Inquietas cordas de suspensa lira.

Não és Ofélia, a virgem lacrimante,
Que ao luar nos jardins vaga e delira,
E é levada nas águas flutuante,
Como em sonho de amor que cedo expira.

És a estátua de mármore de rosa;
Galatéia acordando voluptuosa
Do grego artista ao fogo de mil beijos…

És a lânguida Júlia que desmaia,
És Haidéia nos côncavos da praia;
Fosse eu o Dom João dos teus desejos!…

Vénus

I

À flor da vaga, o seu cabelo verde,
Que o torvelinho enreda e desenreda…
O cheiro a carne que nos embebeda!
Em que desvios a razão se perde!

Pútrido o ventre, azul e aglutinoso,
Que a onda, crassa, num balanço alaga,
E reflui (um olfato que se embriaga)
Como em um sorvo, murmura de gozo.

O seu esboço, na marinha turva…
De pé flutua, levemente curva;
Ficam-lhe os pés atrás, como voando…

E as ondas lutam, como feras mugem,
A lia em que a desfazem disputando,
E arrastando-a na areia, co’a salsugem.

II

Singra o navio. Sob a água clara
Vê-se o fundo do mar, de areia fina…
_ Impecável figura peregrina,
A distância sem fim que nos separa!

Seixinhos da mais alva porcelana,
Conchinhas tenuemente cor de rosa,
Na fria transparência luminosa
Repousam, fundos, sob a água plana.

E a vista sonda, reconstrui, compara,
Tantos naufrágios, perdições, destroços!
_ Ó fúlgida visão, linda mentira!

Róseas unhinhas que a maré partira…
Dentinhos que o vaivém desengastara…

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Praia

Minha praia ardorosa e solitária
aberta ao grande vento e ao largo mar
tu me viste querer-lhe com a doce
piedade das sombras do luar

teus cabos se adiantam como braços
para abraçar as ninfas receosas
que fugindo oferecem sobre as vagas
suas nítidas formas amorosas

braços paralisados por desejo
que o mundo e sua lei não permitiu
ou suspendeu amor que livre jogo
maior que posse em fugaz tempo viu

e como vós me alongo e como tu
areia me ofereço a toda sorte
por sua liberdade ou por destino
que por só dela seja belo e forte.

Em geral quando termino um livro encontro-me numa confusão de sentimentos, um misto de alegria, alívio e vaga tristeza. Relendo a obra mais tarde, quase sempre penso. Não era bem isto o que queria dizer.

Sobre Estas Duras, Cavernosas Fragas

Sobre estas duras, cavernosas fragas,
Que o marinho furor vai carcomendo,
Me estão negras paixões n’alma fervendo
Como fervem no pego as crespas vagas.

Razão feroz, o coração me indagas,
De meus erros e sombra esclarecendo,
E vás nele (ai de mim!) palpando, e vendo
De agudas ânsias venenosas chagas.

Cego a meus males, surdo a teu reclamo,
Mil objectos de horror co’a ideia eu corro,
Solto gemidos, lágrimas derramo.

Razão, de que me serve o teu socorro?
Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo;
Dizes-me que sossegue: eu peno, eu morro.

Que Há para Lá do Sonhar?

Céu baixo, grosso, cinzento
e uma luz vaga pelo ar
chama-me ao gosto de estar
reduzido ao fermento
do que em mim a levedar
é este estranho tormento
de me estar tudo a contento,
em todo o meu pensamento
ser pensar a dormitar.

Mas que há para lá do sonhar?

Caravelas

Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.

Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!

Se eu sempre fui assim este Mar-Morto,
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram.

Caravelas doiradas a bailar…
Ai, quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!…

A Precisão da Escrita não Faz o Bom Escritor

Como escritor, poderá alguém fazer a experiência de que quanto mais precisa, esmerada e adequadamente se expressar, tanto mais difícil de entender será o resultado literário, ao passo que quando o faz de forma laxa e irresponsável se vê recompensado com uma segura inteligibilidade. De nada serve evitar asceticamente todos os elementos da linguagem especializada e todas as alusões a esferas culturais não estabelecidas. O rigor e a pureza da textura verbal, inclusive na extrema simplicidade, criam antes um vazio. O desmazelo, o nadar com a corrente familiar do discurso, é um sinal de vinculação e de contacto: sabe-se o que se quer porque se sabe o que o outro quer. Enfrentar a coisa na expressão, em vez da comunicação, é suspeitoso: o específico, o que não está acolhido no esquematismo, parece uma desconsideração, um sintoma de excentricidade, quase de confusão. A lógica do nosso tempo, que tanto se ufana da sua claridade, acolheu ingenuamente tal perversão na categoria da linguagem quotidiana.

A expressão vaga permite a quem a ouve ter uma ideia aproximada do que é que lhe agrada e do que, de qualquer modo, opina. A rigorosa exige a univocidade da concepção, o esforço do conceito,

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Em Viagem

Desde aquela dor tamanha
Do momento em que parti
Um só prazer me acompanha,
Filha, o de pensar em ti:

Por sobre a negra paisagem
Do meu ermo coração
O luar branco da tua imagem
Veste um benigno clarão.

A tarde, no azul celeste,
Há uma estrela esmorecida,
Que é o beijo que tu me deste
Na hora da despedida.

Beijo tão longo e dolente,
Tão longo e cortado de ais,
Que o meu coração pressente
Que não te torno a ver mais.

Conto no céu estrelado
Lágrimas de oiro sem fim:
É o pranto que tens chorado,
De dia e noite, por mim…

Quando me deito na cama
E vou quase adormecido,
Oiço a tua voz que me chama,
Num suplicante gemido.

Num gemido tão suave,
Tão triste na noite escura,
Que é como uma queixa d’ave
Presa numa sepultura!…

Em sonho, às vezes, meu Deus,
Cuido que vou expirar,
Sem levar nos olhos meus
O teu derradeiro olhar.

E sem extremo conforto
Que eu ness’hora quero ter:
Beijar a fronte do morto
Aquela que o fez viver.

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