O homem cristaliza a sua vida em torno das ideias que angariou até aos trinta ou quarenta anos.
Passagens de Vergílio Ferreira
496 resultadosA honestidade é uma forma de se ser conscientemente modesto.
De vez em quando a eternidade sai do teu interior e a contingência substitui-a com o seu pânico. São os amigos e conhecidos que vão desaparecendo e deixam um vazio irrespirável. Não é a sua ‘falta’ que falta, é o desmentido de que tu não morres.
O Calor das Ideias
Como ter ideias sem o calor do desejo para elas? Desce sobre ti a mortalidade fria. Que significa haver novas ideias com o sangue quente que nas outras já arrefeceu. Tens quando muito a longínqua memória delas. São ideias que já não fazem mover aquele de ti que nelas tinha o seu sangue com que eras vivo. Uma ideia começa no teu sistema muscular de muitos graus centígrados e morre na pele engelhada da tua múmia. Entre os dois ela não mudou senão no que de ti arrefeceu. Tens ao menos alguma ainda viva na memória? Mete-a numa botija e vê se amornas com a sua tepidez a tua miséria tolhida.
Amas ou não uma mulher, mas não sabes porquê. Como hás-de poder saber a razão do bem e do mal?
Quanto mais original é uma obra, mais banal ela se torna.
O convívio com um artista não é a melhor forma de desvendar o mistério da sua obra. Mas é talvez a melhor forma de o destruir. Ou de supor que.
Ama o impossível, porque é o único que te não pode decepcionar.
Ter firmeza de carácter não é dizer sempre que 2 + 2 = 4. É dizer por exemplo que são cinco – e persistir…
Porquê? Para quê? Economiza os teus «porquê» e «para quê». Ou utiliza-os só até onde houver resposta. Porque a última resposta a eles é o impossível e o vazio. Ou então terás de mudar de universo. E estás cá tão bem…
Quando se dão dois beijos é sinal de amizade; quando se tem amor dá-se só um. O amor é exclusivista. Ou concentracionário…
De um velho para um jovem uma verdade pode ser a mesma. Mas para cada um, ela varia ao menos nas pulsações por minuto.
Não penses. Assume-te a evidência que te ilumina. Pensá-la é não a ser.
Não se procura uma doutrina para acharmos a verdade nela, mas para acharmos nela a verdade que é nossa.
O tempo é uma construção artificial que sobrepomos a nós e à qual nos submetemos como a um boneco de horror ou lascivo que pintássemos e que nos subjugasse na sua realidade exterior e inventada por nós. É quando perdemos a noção do tempo que medimos bem o seu artificialismo.
Toda a cultura é um diálogo com o seu tempo.
Porque é que estranhas tanto que um deputado deixe o partido e vá ser deputado para outro lado? O jogador de futebol também muda de clube.
A justiça está voltada para aquele com quem se é justo. A caridade está voltada para quem a pratica.
Fecha os olhos para não seres cego.
O Que Nos Divide
Imaginemos que toda a gente tinha a mesma política, religião, etc. Nem por isso se viveria mais em paz. Porque logo se descobririam diferenças naquilo que a todos unia. E paralelamente surgiriam as discordâncias, invejas e ódios subsequentes. Porque não é a ideologia que no fim de contas divide. A ideologia é apenas um bom pretexto. O que nos divide é a importância da nossa pessoa e o grupo extensivo a que nos recolhemos. O que nos divide é a individualidade que não tem misturas ou só as tem com quem prolongar a pessoa que somos.