O Triunfo dos Imbecis
Não nos deve surpreender que, a maior parte das vezes, os imbecis triunfem mais no mundo do que os grandes talentos. Enquanto estes têm por vezes de lutar contra si próprios e, como se isso não bastasse, contra todos os medíocres que detestam toda e qualquer forma de superioridade, o imbecil, onde quer que vá, encontra-se entre os seus pares, entre companheiros e irmãos e é, por espírito de corpo instintivo, ajudado e protegido. O estúpido só profere pensamentos vulgares de forma comum, pelo que é imediatamente entendido e aprovado por todos, ao passo que o génio tem o vício terível de se contrapor às opiniões dominantes e querer subverter, juntamente com o pensamento, a vida da maioria dos outros.
Isto explica por que as obras escritas e realizadas pelos imbecis são tão abundante e solicitamente louvadas – os juízes são, quase na totalidade, do mesmo nível e dos mesmos gostos, pelo que aprovam com entusiasmo as ideias e paixões medíocres, expressas por alguém um pouco menos medíocre do que eles.
Este favor quase universal que acolhe os frutos da imbecilidade instruída e temerária aumenta a sua já copiosa felicidade. A obra do grande, ao invés, só pode ser entendida e admirada pelos seus pares,
Passagens sobre Vício
362 resultadosLXXVII
Não há no mundo fé, não há lealdade;
Tudo é, ó Fábio, torpe hipocrisia;
Fingido trato, infame aleivosia
Rodeiam sempre a cândida amizade.Veste o engano o aspecto da verdade;
Porque melhor o vício se avalia:
Porém do tempo a mísera porfia,
Duro fiscal, lhe mostra a falsidade.Se talvez descobrir-se se procura
Esta de amor fantástica aparência,
É como à luz do Sol a sombra escura:Mas que muito, se mostra a experiência,
Que da amizade a torre mais segura
Tem a base maior na dependência!
A boa vida é a mãe de todos os vícios.
Insânia De Um Simples
Em cismas patológicas insanas,
É-me grato adstringir-me, na hierarquia
Das formas vivas, à categoria
Das organizações liliputianas;Ser semelhante aos zoófitos e às lianas,
Ter o destino de uma larva fria,
Deixar enfim na cloaca mais sombria
Este feixe de células humanas!E enquanto arremedando Eolo iracundo,
Na orgia heliogabálica do mundo,
Ganem todos os vícios de uma vez,Apraz-me, adstricto ao triângulo mesquinho
De um delta humilde, apodrecer sozinho
No silêncio de minha pequenez!
O Equilíbrio Humano
As nossas opiniões são apenas suplementos da nossa existência e na maneira de pensar de uma pessoa pode ver-se o que lhe falta. Os indivíduos mais frívolos são os que se têm a si mesmos em grande consideração, e as pessoas de maior qualidade são apreensivas. O homem de vícios é descarado e o virtuoso é tímido. Deste modo tudo se equilibra: cada um de nós quer ser completo ou, pelo menos, quer ver-se como tal.
O vício fomenta a guerra, a virtude combate-a.
O interesse obra toda a espécie de virtudes e de vícios.
És Feliz?
Só há uma forma de seres feliz: tens de fazer por isso.
És feliz? Queres ser? Fazes alguma coisa por isso?
Se fores, maravilha, transportas a belíssima responsabilidade de inspirar os outros a sê-lo também. Se ainda não és, mas queres sê-lo, o que tens feito por isso? Andas a respeitar-te mais vezes? A lutar pela vivência das tuas vontades? Andas mais perto da natureza? Já consegues dizer mais vezes aquilo que sentes e aquilo que pensas? Já não pões sempre os outros à tua frente? Começaste a cuidar do teu corpo e da tua alimentação? Reduziste os vícios? Se sim, fantástico. Parabéns! Gosto muito de pessoas felizes, mas a minha admiração vai toda para aqueles que, não o sendo ainda, lutam todos os dias para o ser, pela autodescoberta que os fará referência na vida de todos aqueles que os rodeiam. Agora, e por outro lado, se não tens andado a fazer nada disto nem nada semelhante, mais vale assumires que, afinal, ser feliz não é uma vontade tua. E está tudo bem na mesma. Apenas te peço, em nome da comunidade dos seres humanos que querem viver e desfrutar desta amável oportunidade que nos foi dada de aqui estar,
Nada Pior que a Frivolidade
A frivolidade, meu amigo, aniquila os homens que a ela se apegam; talvez não haja vício que não se deva preferir a ela, pois ainda é melhor ser vicioso do que não ser nada. O nada está abaixo do tudo, o nada é o maior dos vícios; e que não me diga que é ser alguma coisa o ser frívolo: é não ser nem para a virtude, nem para a glória, nem para a razão, nem para os prazeres apaixonados. Direis talvez: gosto mais de um homem nulo para qualquer vitude do que daquele que só existe para o vício. Eu vos responderei: aquele que é nulo para a virtude não está por isso livre dos vícios; ele pratica o mal por leviandade e por fraqueza; ele é o instrumento dos maus que têm mais génio. Ele é menos perigoso do que um homem seriamente empenhado no mal, isso é possível; mas será necessário ser grato ao gavião por ele só destruir os insectos e por ele não destruir os rebanhos e os campos como os leões e as águias? Um homem corajoso e dotado de sabedoria não teme um homem mau; mas não pode impedir-se de desprezar um homem frívolo.
Os vícios são filhos dos maus costumes.
A vaidade entre os vícios é o pescador mais astuto, e que mais facilmente engana os homens.
Revolução
Como casa limpa
Como chão varrido
Como porta abertaComo puro início
Como tempo novo
Sem mancha nem vícioComo a voz do mar
Interior de um povoComo página em branco
Onde o poema emergeComo arquitectura
Do homem que ergue
Sua habitação
O próprio vício, perdendo toda a sua baixeza, perdeu metade do seu mal.
O trabalho poupa-nos de três grandes males: tédio, vício e necessidade.
A gula é um vício que nunca acaba, e é aquele vício que cresce sempre, quanto mais o homem envelhece.
A inveja é o mais estúpido dos vícios, pois deste não se obtém nenhuma vantagem.
Não Consigo Viver em Literatura
Por mais que o deseje, não consigo viver em literatura. Felizes os que o conseguem. Viver em literatura é suprimir toda a interferência do que lhe é exterior – desde o peso das pedradas ao das flores da ovação. Suprimir mesmo ou sobretudo a conversa sobre ela, desde a dos jornais à dos amigos. Fazer da literatura um meio enclausurado em que a respiremos até à intoxicação e nada dele transpire para a exterioridade. Viver a arte como uma mística, um transporte de inebriamento, uma iluminação da graça, uma inteira absorção como de um vício inconfessável. Vivê-la na intimidade de uma absoluta solidão em que toda a ameaça de público esteja ausente como numa ilha que a impossibilidade de comunicação tornasse de facto deserta. Os recém-casados isolam-se para defenderem dos outros a mínima parcela da paixão. A vida em arte devia ser uma viagem de núpcias sem retorno. Só então se conheceria tudo o que a arte é para nós e a inteira verdade com que nós somos para ela. Mas não. Há que viver uma vida dúplice entre o estar a sós com ela e o permanente convívio, nem que sejam uns breves instantes à porta com os indiferentes e os maledicentes e os curiosos e mesmo os admiradores de que se necessita na nossa inferioridade moral para nos confirmarem no bom resultado da aposta.
Há tantos vícios com origem naquilo que não estimamos o suficiente em nós, como no que estimamos mais.
A ociosidade é a mãe da maledicência, da calúnia e da intriga, coisas a que eu já não sei se hei-de chamar vícios se virtudes, tão habituada estou a vê-los morar em lábios tidos como santos por este mundo que é com certeza o melhor dos mundos possíveis e imagináveis.
Pelo vício alheio corrige o teu.