Soneto de Contrição
Eu te amo, Maria, eu te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.Não é maior o coração que a alma
Nem melhor a presença que a saudade
Só te amar é divino, e sentir calma…E é uma calma tão feita de humildade
Que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.
Passagens de Vinicius de Moraes
171 resultadosNádegas é importantíssimo. Grave, porém, é o problema das saboneteiras. Uma mulher sem saboneteiras é como um rio sem pontes.
Soneto de Carnaval
Distante o meu amor, se me afigura
O amor como um patético tormento
Pensar nele é morrer de desventura
Não pensar é matar meu pensamento.Seu mais doce desejo se amargura
Todo o instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado é uma tortura
Um ciúme do próprio ciumento.E vivemos partindo, ela de mim
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos
Para a grande partida que há no fimDe toda a vida e todo o amor humanos:
Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo
Que se um fica o outro parte a redimi-lo.
Tomara Que você volte depressa Que você não se despeça Nunca mais do meu carinho E chore, se arrependa E pense muito Que é melhor se sofrer junto Que viver feliz sozinho
Quanta tristeza
Há nesta vida
Só incerteza
Só despedida
Máscara Mortuária De Graciliano Ramos
Feito só, sua máscara paterna
Sua máscara tosca de acridoce
Feição, sua máscara austerizou-se
Numa preclara decisão eterna.Feito só, feito pó, desencantou-se
Nele o intimo arcanjo, a chama interna
Da paixão em que sempre se queimou
Seu duro corpo que ora longe inverna.Feito pó, feito pólem, feito fibra
Feito pedra, feito o que é morto e vibra
Sua mácara enxuta de homem forteIsto revela em seu silêncio à escuta:
Numa severa afirmação da luta
Uma impassível negação da morte.
‘Ah, quem me dera. Ir-me contigo agora a um horizonte firme, comum. Embora amar-te. Ah, quem me dera amar-te sem mais ciúmes. De alguém em algum lugar que nem presumes.. ‘
Soneto Da Rosa Tardia
Como uma jovem rosa, a minha amada…
Morena, linda, esgalga, penumbrosa
Parece a flor colhida, ainda orvalhada
Justo no instante de tornar-se rosa.Ah, porque não a deixas intocada
Poeta, tu que es pai, na misteriosa
Fragrância do seu ser, feito de cada
Coisa tão frágil que perfaz a rosa…Mas (diz-me a Voz) por que deixa-la em haste
Agora que ela e’ rosa comovida
De ser na tua vida o que buscasteTão dolorosamente pela vida ?
Ela e’ rosa, poeta… assim se chama…
Sente bem seu perfume… Ela te ama…
O amor é querer estar perto, se longe; e mais perto, se perto.
Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Você bem que podia me aparecer, nesses mesmos lugares, nas noites, nos bares, onde anda você?!
Que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure.
Soneto A Quatro Mãos
Tudo de amor que existe em mim foi dado
Tudo que fala em mim de amor foi dito
Do nada em mim o amor fez o infinito
Que por muito tornou-me escravizado.Tão pródígo de amor fiquei coitado
Tão fácil para amar fiquei proscrito
Cada voto que fiz ergueu-se em grito
Contra o meu próprio dar demasiado.Tenho dado de amor mais que coubesse
Nesse meu pobre coração humano
Desse eterno amor meu antes não desse.Pois se por tanto dar me fiz engano
Melhor fora que desse e recebesse
Para viver da vida o amor sem dano.
Quem é homem de bem não trai o amor que lhe quer seu bem. Quem diz muito que vai, não vai, assim como não vai, não vem. Quem de dentro de si não sai, vai morrer sem amar ninguém.
Mário
Entre meditabundo e sonolento
Sobre a fofa delícia da almofada
Ele vai perseguindo na jornada
Através do Ottocento e o NovecentoNão o tires dali que dá pancada
Todo o resto prá ele é sofrimento
Vai colhendo da flor do pensamento
Toda a filosofia desejadaSó abandona voluntário o élan
Para o banho de poço da manhã
“Mens sana…” disse François LeblonE às vezes, Carnaval, diz na folia
E passeia porrado pela orgia
Sob o signo pagão do rei Mammon.
O dinheiro de quem não dá é o trabalho de quem não tem.
Himeneu
Na cama, onde a aurora deixa
Seu mais suave palor
Dorme ninando uma gueixa
A dona do meu amor.De pijama aberto, flui
Um seio redondo e escuro
Que como, lasso, possui
O segredo de ser puro.E de uma colcha, uma coxa
Morena, na sombra frouxa
Irrompe, em repouso mornoEnquanto eu, desperto, a vê-la
Mesmo sendo o homem dela
Me morro de dor-de-corno.
De manhã, escureço. De dia, tardo. De tarde, anoiteço. De noite, ardo.
O amor é imortal, posto que é chama
Soneto De Criação
Deus te fez numa fôrma pequenina
De uma argila bem doce e bem morena
Deu-te uns olhos minúsculos de china
Que parecem ter sempre um olhar de pena.Banhou-te o corpo numa fonte fina
Entre os rubores de uma aurora amena
E por criar-te assim, leve e pequena
Soprou-te uma alma calma, cálida e divina.Tão formosa te fez, tão soberana
Que dar-te aos anjos por irmã queria
Mas ao plasmar-te a carne prediletaDeus, comovido, te criara humana
E para tua justa moradia
Atirou-te nos braços do poeta.